Yehudit
Yehudit

Pouco antes do famoso milagre de Chanucá, da vitória dos macabim e da expulsão dos gregos de Israel, os gregos já tinham cercado e conquistado várias cidades. Uma das cidades sitiadas pelo poderoso exército grego foi a cidade de Betulia. Lá, a corajosa Yehudit foi a responsável pela milagrosa derrota do malvado general grego Holofernes.

Betulia era uma cidade na Terra de Israel cercada por muralhas.

Ante o perigo da invasão do poderoso exército grego, os judeus daquela cidade se fortificaram em seu interior e prepararam-se para aguentar o cerco do inimigo o máximo possível. Todos sabiam que tentar enfrentar o exército grego seria uma grande loucura.

O temido general grego Holofernes chegou à cidade com um vasto exército, pronto a invadir e destruir tudo e todos.

Holofernes acampou com seu exército às portas da cidade e colocou sentinelas em todos os portões à espera de uma oportunidade de atacar. As muralhas e os portões da cidade eram praticamente indevassáveis. Assim, os gregos ficaram esperando até que os judeus abrissem os portões por algum motivo qualquer, e então atacariam.

Entretanto, os gregos logo perceberam que os judeus poderiam aguentar por muito tempo aquela situação, sem que ninguém entrasse ou saísse da cidade. Sendo assim, o poderoso general colocou um perverso plano em ação.

Seus soldados vasculharam as muralhas que cercavam toda a cidade e descobriram os canais que a abasteciam de água. Depois, Holofernes ordenou que seus soldados aterrassem e desviassem o curso desses canais, impedindo que a cidade fosse reabastecida. Desta forma, os judeus de Betulia, que antes poderiam aguentar o sítio por muitos meses, viram-se numa situação extremamente difícil. A água armazenada dentro das muralhas da cidade duraria apenas poucos dias. Depois, seus habitantes seriam obrigados a se render ou enfrentar uma batalha praticamente sem esperanças de vitória.

Nem todo o exército de Holofernes, porém, concordava com a guerra contra os judeus. Um de seus principais conselheiros, Achior, preveniu-o sobre os perigos de tal campanha.

- Poderoso general! - disse o conselheiro. - É extremamente perigoso guerrear contra os judeus. Eu conheço bem a história desse povo. Seu D'us é muito poderoso. Todo o tempo que eles cumprem Sua vontade, Ele os protege. Muitos outros reis e generais mais poderosos que você tentaram aniquilar o Povo de Israel e acabaram sendo destruídos. Creio que seria melhor desistirmos desta guerra!

Holofernes, entretanto, ao invés de ouvir as sábias palavras de seu conselheiro, ficou furioso com sua audácia. Imediatamente, mandou que Achior fosse acorrentado e preso numa gaiola, que foi pendurada em frente aos portões de Betulia.

- Você pagará caro por ter se rebelado contra seu general! - gritou Holofernes para o ex-conselheiro. - Eu deixarei que você viva para ver a queda dos judeus e depois o matarei junto com eles!

Os soldados judeus viram, de dentro da cidade, o pobre homem preso e pendurado dentro daquela gaiola às portas da cidade. Gritando aos prantos, Achior explicou o motivo de sua prisão e implorou pela ajuda dos judeus.

Os soldados judeus apiedaram-se do homem e levaram-no para dentro da cidade. Temendo, contudo, que aquilo fosse uma cilada armada por Holofernes, mantiveram Achior preso até que sua história fosse verificada.

Enquanto isso, dentro das muralhas da cidade, os judeus estavam desesperados. A água estava terminando e não havia esperanças de que a situação melhorasse.

Os chefes da comunidade decretaram dias de jejuns e preces para D'us, suplicando para que Ele os salvasse.

Entre os habitantes de Betulia havia uma jovem justa e temente a D'us chamada Yehudit. Yehudit era descendente de uma família de sábios e profetas, era muito rica e extremamente bela.

Yehudit, que passava os dias rezando para que o Todo-Poderoso tivesse piedade de seu povo, não aguentava ver o sofrimento de seus irmãos judeus. A jovem, que estava disposta a dar a vida por seu povo, se necessário fosse, resolveu que faria algo para tentar salvar seus irmãos naquele momento de desespero.

Assim, a corajosa jovem vestiu suas roupas mais caras, enfeitou-se com belas jóias e dirigiu-se com uma de suas escravas para os portões da cidade sitiada. Antes, porém, Yehudit ainda fez uma prece fervorosa ao Todo-Poderoso, para que Ele iluminasse seu caminho e enviasse a salvação de Seu povo por intermédio de suas mãos.

Os sentinelas judeus que guardavam os portões hesitaram em deixar a jovem sair da cidade. Talvez ela estivesse planejando traí-los e revelar segredos sobre a organização da cidade para o terrível general grego. Porém, quando os soldados ouviram suas palavras de fé e confiança em D'us e perceberam que ela realmente estava disposta a colocar sua vida em risco para tentar salvar seu povo, acabaram por deixá-la sair.

- Vá, e que D'us esteja com você! - disseram os soldados abrindo os portões.

Com essas palavras de apoio dos sentinelas, a jovem afastou-se da cidade sozinha com sua escrava em direção ao acampamento grego.

Mal se aproximara do acampamento inimigo, Yehudit se viu cercada por soldados gregos, que a prenderam e levaram-na ante a presença de seu general. Holofernes ficou imediatamente encantado com a beleza da jovem judia.

- Quem é você, moça? E o que faz sozinha aqui em meu acampamento? - perguntou o general em tom cordial.

- Meu nome é Yehudit - respondeu a jovem humildemente. - Eu sei que, cedo ou tarde, o senhor conquistará nossa cidade e a destruirá. Por isso, vim me entregar e implorar para que minha vida e a de minha família sejam poupadas. Estou disposta a tornar-me sua escrava e servi-lo durante o resto de minha vida em troca disso.

As palavras da moça agradaram imensamente o poderoso general. Uma moça judia, de família importante, passando para o lado grego, seria mais um duro golpe sobre a já abalada confiança dos judeus da cidade.

- Eu concordo em poupá-la e a sua família - disse o general decidido. - Não quero, porém, que você seja minha escrava. Quero que você se case comigo.

- Eu estou em suas mãos para que o senhor faça comigo o que achar melhor - disse Yehudit humildemente. - Só peço que me conceda um favor. Eu costumo banhar-me todas as noites nas águas do rio, mas tenho medo de ser incomodada por seus guardas. Gostaria de ter sua autorização para fazer isso.

Imediatamente, o general mandou que seus soldados deixassem Yehudit e sua escrava caminhar livremente pelo acampamento, e ameaçou de morte qualquer um que a interpelasse ou a incomodasse em seus passeios.

No final da tarde, Yehudit realmente foi com sua escrava até o rio. Não para banhar-se, mas sim para implorar novamente ao Todo-Poderoso que tivesse piedade e salvasse seu povo.

Naquela mesma noite, Yehudit convidou o general para um banquete a dois, com comidas que ela mesma prepararia. O general aceitou satisfeito o convite e Yehudit começou a pôr seu plano em prática.

A jovem tinha trazido de sua casa um delicioso queijo forte e salgado. Durante o banquete, ela serviu o queijo ao general e, ao mesmo tempo, foi oferecendo vários litros de um vinho doce para matar sua sede. Distraído, o general comia o queijo e bebia fartamente o vinho.

Quanto mais comia o queijo salgado, mais sede tinha o general. Em poucas horas ele ficou completamente bêbado e sonolento. Já era tarde da noite quando, finalmente, o terrível Holofernes caiu num sono pesado provocado por todo o vinho que havia bebido. Sorrateiramente, Yehudit retirou a pesada espada que pendia da cintura do general prostrado e murmurou uma breve prece:

- Senhor do Mundo, dá-me forças esta única vez!

Dizendo isto, Yehudit levantou a espada e golpeou com toda sua força o pescoço do general. Foram necessários dois golpes até que a cabeça do perverso estivesse completamente separada de seu corpo.

Imediatamente, Yehudit pegou a cabeça do general e embrulhou-a em sua capa. Com o coração disparado, quase saltando pela boca, a corajosa mulher chamou sua escrava e mostrou-lhe o que conseguira fazer.

As duas ainda precisaram esperar alguns minutos para recuperar a cor de suas faces pálidas.

Encorajando-se mutuamente, as jovens saíram da tenda de Holofernes, caminhando calmamente, como se nada tivesse ocorrido, em direção ao rio. A vontade de Yehudit era correr o máximo possível de volta à sua cidade. Entretanto, naquele momento, qualquer movimento brusco ou expressão suspeita poderia denunciá-las aos inimigos.

Os sentinelas gregos estranharam ver as duas mulheres caminhando pelo acampamento numa hora tão tardia, mas não se aproximaram delas nem disseram nada. Afinal, Holofernes havia sido muito claro em sua ordem para que deixassem as moças andar livremente, e todos temiam enfrentar sua ira se desobedecessem suas palavras.

Quando Yehudit percebeu que já não podia mais ser vista pelos soldados do acampamento, mudou de direção e correu com sua escrava para Betulia, que permanecia completamente fechada, com medo da invasão do inimigo grego. Os soldados que guardavam os portões assustaram-se com os gritos da mulher que pedia para entrar, mas logo reconheceram a voz da jovem Yehudit e abriram os portões para que ela e sua escrava entrassem.

Quando Yehudit finalmente conseguiu mostrar o que trazia em suas mãos, os soldados judeus não queriam acreditar que aquela era a cabeça do tão temido general grego.

Achior, o prisioneiro que tinha sido condenado por Holofernes por ter desaconselhado a guerra contra os judeus, foi trazido para reconhecer a cabeça de seu senhor. Achior não pôde conter sua surpresa ao saber que o terrível e poderoso Holofernes tivera a cabeça decepada por uma jovem indefesa.

- Bendito é o D'us de Israel que colocou seus inimigos em suas mãos! - exclamou Achior espantado, ajoelhando-se no chão.

A notícia da miraculosa morte do general espalhou-se como fogo pela cidade, levando gritos de alegria e júbilo por onde passava. Somente Yehudit ainda não estava tranquila.

- Agora ainda não é o momento para comemorações - disse a jovem aos líderes da cidade. - Devemos aproveitar esta oportunidade para um contra-ataque aos gregos antes que eles possam se reorganizar.

Rapidamente, o pequeno mas confiante exército judeu começou a se formar. Jovens e velhos, fortes e fracos, soldados armados e trabalhadores com armas improvisadas, juntaram-se a seus líderes e avançaram em direção ao acampamento grego, alcançando-o antes do amanhecer.

Quando os oficiais gregos ouviram os gritos de guerra e viram o exército judeu aproximando-se rapidamente, permaneceram mudos de espanto.

- O que aconteceu para que eles saíssem de seus buracos? - perguntaram, rindo-se, uns aos outros.

Imediatamente, um dos oficiais entrou na tenda do general para acordá-lo e prepará-lo para a batalha que se aproximava. Qual não foi sua surpresa ao encontrar o corpo de seu líder estirado no chão, completamente sem vida... e sem cabeça. Com os olhos arregalados e com a face branca como a neve, o oficial grego saiu da tenda e contou para seus companheiros a terrível notícia. Neste momento, um imenso pavor tomou conta do exército grego.

Antes que os oficiais pudessem se recuperar do susto e organizar suas tropas, os judeus invadiram o acampamento e atacaram-no violentamente. Amedrontados, desorganizados e sem liderança, os gregos caíam como moscas frente ao pequeno, mas valente e confiante, exército de Israel. Os soldados gregos que permaneceram vivos nem mesmo tentaram uma reação, fugiram em debandada, deixando para trás suas armas, seus animais e seus pertences.

Os judeus pegaram as armas e tudo que tinha algum valor do acampamento abandonado e voltaram alegremente para a cidade. Os soldados reabriram ainda os canais de água fechados pelos gregos e a cidade comemorou feliz, agradecendo ao Todo-Poderoso, a milagrosa vitória.

A coragem e o sacrifício da virtuosa Yehudit por seu povo ficaram marcados na história do Povo de Israel. Nossos sábios, em lembrança desta vitória e do milagre de Yehudit, instituíram o costume de comer laticínios em Chanucá, em lembrança do queijo salgado que levou à morte o poderoso Holofernes.