
Há alguns anos, um indivíduo rico foi para Israel passar as férias com sua família por algumas semanas. Ele ficou hospedado no famoso hotel “Malon Mercaz”, na rua Pines, em Jerusalém. Lá ele fazia a maioria das suas refeições.
Numa sexta-feira à noite, depois da sua refeição de Shabat, o cavalheiro resolveu caminhar um pouco pela rua. Quando ainda estava em frente ao hotel, percebeu dois jovens chassidim andando apressados.
- Aonde vocês estão indo? - perguntou o visitante, enquanto os jovens continuavam andando rapidamente.
Sem parar para responder nem diminuir o passo apurado, um dos jovens olhou para o homem e disse:
- Nós estamos indo para o “tish”
Quando entraram no salão, o cavalheiro se separou dos dois rapazes e misturou-se com a multidão presente. Depois de alguns momentos, encontrou um lugar no fundo da sinagoga, onde permaneceu observando tudo o que acontecia.
Meu tio, um fervoroso chassid de Stoliner por décadas, tinha ido naquela semana a Jerusalém para ficar com o seu rebe. Ele também estava no tish, sentado na parte da frente da sinagoga, perto do rebe.
Ao olhar em volta pela sinagoga, meu tio percebeu algumas pessoas que não eram frequentadoras conhecidas das reuniões do rebe. Foi aí que ele reconheceu o homem recém-chegado que se sentara nos fundos da sinagoga.
Meu tio, além de ser um devoto chassid do Stoliner Rebe, é o fundador e coletor de fundos da Yeshivat Stoliner em Benê Berak, em Israel.
Antes de Shabat, meu tio tinha conversado com o rebe. O rebe tinha lhe recomendado que não deixasse Jerusalém antes de levantar a quantia de U$25.000,00 em benefício da yeshivá. A yeshivá estava passando por dificuldades financeiras e necessitava urgente de uma grande soma em dinheiro para amenizar o problema. No entanto, meu tio não tinha a mínima ideia de como poderia concretizar o pedido do rebe integralmente.
Assim, com as palavras do rebe ainda frescas, quando meu tio avistou aquele senhor rico, pensou que seria uma boa ideia ir falar com ele. Quando o tish já estava terminando, meu tio se dirigiu ao encontro do homem, que ainda estava no mesmo lugar.
Meu tio, um sujeito jovial e robusto, estendeu sua mão e com um enorme sorriso disse:
- Shabat Shalom! Bem vindo a Stoliner! Eu creio que conheço você.
Meu tio sabia muito bem que aquele cavalheiro tinha a reputação de ser um grande filantropo que apoiava muitas causas judaicas. Ele esperava que o homem talvez apoiasse também a sua causa.
- Shabat Shalom! - respondeu o homem olhando para o meu tio. - Eu também acho que conheço você - disse ainda.
Os dois conversaram por alguns instantes e então meu tio perguntou:
- Onde você está hospedado?
- Eu estou no Malon Mercaz - respondeu o visitante.
- E até quando você permanece na cidade?
- Pretendo ficar até terça-feira.
Meu tio levou a mão ao queixo pensativo por alguns segundos e sugeriu:
- Será que eu poderia levar alguns amigos amanhã à noite ao hotel onde você está hospedado? Nós faríamos juntos um pequeno “melavê malcá”, a refeição festiva de despedida do Shabat. Nós poderíamos cantar um pouco, dançar, contar algumas histórias, comer algumas coisas gostosas... Seria muito agradável!
O filantropo entendeu muito bem a intenção do meu tio, e com um sorriso no rosto disse:
- Claro que sim! Venha com seus amigos amanhã à noite.
Na noite seguinte, pouco depois do final do Shabat, meu tio, acompanhado por três amigos, foi ao Malon Mercaz e subiu ao quarto do cavalheiro.
Ele bateu à porta e esperou. Passaram-se alguns instantes e os quatro amigos começaram a imaginar que o homem tivesse esquecido do melavê malcá, ou que algum imprevisto o tivesse impedido de esperá-los.
Depois de mais alguns momentos, entretanto, o cavalheiro abriu a porta.
- Desculpem a demora - disse o anfitrião. - Que bom que vocês vieram! Entrem por favor.
Por mais de duas horas eles cantaram, contaram histórias e deleitaram-se com o ambiente agradável da noite.
Finalmente, o cavalheiro se virou para o meu tio e disse:
- Ackerman, a reunião está muito agradável. Obrigado por ter vindo. Mas o que você quer de mim? Eu imagino que você não veio aqui somente para cantar e dançar...
Meu tio sorriu envergonhadamente e disse:
- Você tem razão. Eu não vim aqui apenas para cantar. Eu vim também por uma razão muito importante.
Então ele explicou sobre o problema financeiro da Yeshivat Stoliner. Por causa das dificuldades econômicas em Israel, a yeshivá dependia quase totalmente do apoio dos amigos da América.
- Eu preciso da sua ajuda - meu tio afirmou seriamente. - O rebe me disse que eu preciso arrecadar U$25.000,00 antes de partir para Benê Berak.
Todos no quarto ficaram quietos.
O cavalheiro mergulhou em pensamentos profundos, com os olhos fechados, enquanto pensava nas palavras do meu tio.
- Eu vou te dizer uma coisa, Ackerman! - finalmente ele exclamou. - Eu vou lhe fazer um donativo agora, e se você arrecadar mais dez mil dólares até amanhã à noite, eu completarei os outros dez mil que faltarem para realizar o pedido do rebe.
Meu tio e seus amigos não conseguiam acreditar em seus ouvidos. Nunca passara por suas mentes que aquele homem faria uma oferta tão maravilhosamente surpreendente.
Os homens aceitaram a oferta entre sorrisos, apertaram a mão do benfeitor e, alguns momentos depois, deixaram o hotel. Então meu tio iniciou imediatamente seus esforços no sentido de arrecadar mais dez mil dólares para a yeshivá.
Durante a maior parte da noite e no dia seguinte, meu tio correu de uma pessoa para outra, explicando que ele possuía uma oportunidade de ouro para aliviar a Yeshivat Stoliner de uma grande parte de seu fardo financeiro. Bastava que cada pessoa ajudasse conforme suas possibilidades. Cada donativo contaria em dobro para a yeshivá.
Ele arrecadou dinheiro, cheques, traveller checks, tudo que conseguiu. Não parou por um instante. No domingo à noite ele já estava próximo de alcançar sua meta.
No final da noite de domingo, o Rabino Yehudá Ackerman se dirigiu ao Malon Mercaz. Ele foi direto ao quarto do benfeitor, que aguardava sua resposta. Então meu tio começou a empilhar todo o dinheiro que tinha recolhido em cima da mesa.
Eles contaram e, logicamente, meu tio tinha atingido seu objetivo. Ele conseguira arrecadar dez mil dólares em praticamente um dia.
O filantropo prontamente tirou seu talão de cheques e preencheu um cheque para a Yeshivat Stoliner no valor de dez mil dólares.
Meu tio simplesmente não conseguia acreditar no que estava acontecendo. Pela primeira vez em muitos anos ele estava sem fala. Ele tinha concretizado o pedido do rebe completamente em um tempo mínimo... com a ajuda de um benfeitor que “caíra do céu”.
Quando meu tio começou a agradecer copiosamente ao cavalheiro, ele perguntou:
- Você não está curioso para saber o motivo disso tudo?
- Curioso?! - exclamou meu tio rindo. - Para mim é um milagre! Tudo isso é “man min hashamáyim”! - como o alimento que caía miraculosamente dos Céus para os judeus no deserto.
- Sente-se, Ackerman - disse o cavalheiro. - Deixe-me contar toda a história e você vai entender tudo.
“Há vinte e cinco anos atrás,” o cavalheiro começou, “era a tarde do dia do meu casamento.
“Eu era tão pobre que meus pais não tinham dinheiro nem para comprar um chapéu para eu usar na cerimônia do meu casamento.
“Eu morava em Williamsburg, um bairro que abrigava muitos judeus religiosos em Nova Iorque. Então eu saí de casa e andei pela Avenida Broadway, onde havia uma famosa loja de chapéus. Eu entrei e falei para o dono da loja:
“- Eu vou me casar nesta noite, mas meus pais são tão pobres que não podem me comprar um chapéu. Você poderia fazer o favor de me dar um chapéu? Eu lhe prometo que amanhã de manhã voltarei aqui e pagarei o chapéu com o dinheiro que espero ganhar esta noite como presente de casamento.
“O homem atrás do balcão olhou bem para mim e respondeu:
“- Você parece um ‘bachur yeshivá’ honesto. Eu vou te dar um chapéu!
“Eu fiquei tão alegre e grato àquele homem!... Eu saí da loja e, algum tempo depois, avistei uma loja de bebidas, cujo dono também era judeu. Eu sabia muito bem que meus pais também não podiam comprar bebidas para o casamento; um vinho...
“Então eu entrei naquela loja e disse novamente para o homem atrás do balcão: ‘Eu vou me casar nesta noite e meus pais não têm dinheiro para comprar uma garrafa de vinho. Será que o senhor poderia fazer uma bondade e me dar algumas garrafas para o meu casamento? Eu prometo que amanhã de manhã eu voltarei e pagarei com o dinheiro que espero ganhar como presente de casamento.’
“O dono daquela loja também olhou para mim e disse a mesma coisa que o outro:
“- Você parece ser um ‘bachur yeshivá’ honesto. Eu vou te dar as bebidas! ‘Mazal tov’, querido!
“Ele me deu as garrafas e eu saí da loja com o chapéu em uma mão e a caixa de bebidas na outra. Eu me senti como um milionário! Eu estava extasiado!
“Então eu andei alguns passos para fora da loja e aí... eu encontrei você, senhor Ackerman.
Meu tio, Rav Yehudá Ackerman, era conhecido naquela época como o mais extraordinário dançarino dos casamentos judaicos. Cada vez que ele entrava no meio do círculo onde todos estavam dançando, ele se tornava o ponto central das danças. E todos se afastavam para observá-lo dançar.
Todas as pessoas na festa paravam o que estivessem fazendo, somente para acompanhar a “performance” do meu tio para agradar o chatan e a calá.
Os movimentos de seu corpo eram elegantes. Seu balanço vibrante entretinha. A alegria de seu sorriso radiante contagiava os presentes. Sua coordenação com a música era incrível e inesquecível. De alguma forma, ele conseguia se tornar a incorporação física das notas musicais emanadas do violino, do clarinete e da bateria, populares naquela época.
“Eu vi”, continuou o cavalheiro, “que D’us tinha sido tão bom comigo, ajudando-me com o chapéu e com a bebida!... Então imaginei que talvez eu pudesse arriscar mais uma vez. Foi aí que eu me dirigi a você e disse:
“- Senhor Ackerman, eu imagino que o senhor não saiba quem eu sou. Mas eu vou me casar esta noite. O senhor se importaria em participar das danças no meu casamento?
“Você disse que não podia prometer nada, mas anotou meu nome e o endereço do salão de festas.
“Naquela noite, bem no meio das danças, você entrou correndo no centro da pista, onde todos estavam dançando, e dançou tão magnificamente!... Os convidados adoraram! Você os deixou tão alegres! Você ajudou a tornar aquela a melhor noite da minha vida.
“Quando chegou o final da noite, eu jurei para mim mesmo que algum dia eu lhe retribuiria de alguma forma por sua bondade.
“Agora, após todos esses anos”, o cavalheiro concluiu, “na noite passada, quando eu vi você no tish do Stoliner Rebe, eu me lembrei do que eu tinha dito para mim mesmo na noite do meu casamento. Eu percebi que agora era a hora de tentar retribuir aquele enorme presente. Por isso que eu fiz toda esta doação.”
Meu tio ficou chocado. Ele não tinha se lembrado daquele casamento por muito tempo. Mas certamente ele nunca mais esqueceria aquela noite de motsaê Shabat em Jerusalém!
Os dois homens comovidos se abraçaram e agradeceram um ao outro pelos favores prestados de coração. A história, entretanto, não acaba aqui.
Quando meu tio esteve na cidade onde este generoso homem vivia, ficou sabendo que o filho dele estava prestes a se casar. Meu tio se informou sobre o dia e o local da festa.
Na noite do casamento, ele esperou até o meio da comemoração e, da mesma forma que tinha feito há mais de vinte e cinco anos atrás, ele correu para o centro da pista onde todos estavam dançando. Ele começou a dançar como tinha feito há muito tempo. Da mesma forma que da outra vez, todos os presentes pararam para acompanhar admirados e sorridentes o encanto e a beleza de seus movimentos.
Então o dançarino se virou e olhou para o cavalheiro parado ao lado da pista. O pai do noivo esboçava um enorme sorriso em sua face e lágrimas rolavam de suas bochechas. Meu tio correu para o homem e novamente os dois se abraçaram emocionados.
- Como posso te agradecer?! - disse o cavalheiro para o meu tio. - Novamente você me presenteou com a noite mais feliz da minha vida!
* * *
A Guemará Yomá (9b) nos ensina que o Segundo Bêt Hamicdash foi destruído por causa do ódio gratuito que existia entre as pessoas. Neste episódio, entretanto, percebemos uma demonstração de amor gratuito, quando um talentoso indivíduo dançou no casamento de um jovem que ele nunca tinha visto antes e que não pensou ver novamente. Tudo por conta do amor. O amor gratuito de um judeu por outro, sem nenhum motivo ou incentivo.
Possamos todos nós aprender com esta incrível história e ter o mérito de juntos ver a construção do Terceiro Bêt Hamicdash. Amen.
“A Dance for the Ages” no livro “In the Footsteps of the Maggid” do Rabino Pessach J. Krohn.
Publicado com permissão da Mesorah Publications.