Não se vingar
Neste parágrafo, o Rambam trata de dois assuntos importantes e proibidos por Hashem: a vingança e o rancor.
Alguém que se vinga de seu semelhante transgride uma mitsvá lô taassê. Portanto, não deve ser violada em hipótese alguma, independentemente do que pensa aquele que pretende cometê-la - caso acredite que se trata de algo nobre, oportuno em uma ou outra situação. A vingança não deve ser cometida jamais, pois foi algo imposto por Hashem.
E o Rambam ainda emite sua opinião, afirmando que a sede por represália é um traço de caráter muito negativo e, portanto, deve ser erradicado.
O autor prossegue observando que motivos para que alguém se vingue não hão de faltar, mas é preciso que se aprenda a ceder. Quem consegue isso é chamado, por nossos chachamim, de maavir al midotav (que cede e não é minucioso em cobrar as faltas do próximo para com ele). E todo maavir al midotav terá o perdão de Hakadosh Baruch Hu em relação a todos os seus próprios pecados.
Para quem entende que todo motivo para a vingança é sempre banal, fica a clareza de que nada vale a pena, se trouxer como consequência a transgressão de uma mitsvá.
No parágrafo sete deste capítulo, o Rambam traz o exemplo que está na Guemará para ilustrar o que é a vingança: “Um amigo pede ao outro que lhe empreste uma picareta. O outro nega. Algum tempo depois, essa mesma pessoa que negou o favor precisa que o outro lhe faça algo. Aproveitando da oportunidade, o amigo que teve a picareta negada recusa-se a ser prestativo para com o outro, recordando-lhe que, quando teve a oportunidade, ele também não o ajudou”. Nesse momento, ao negar o favor, motivada exclusivamente pelo gesto inicial do outro a pessoa acaba de transgredir a
mitsvá lo taassê que proíbe a vingança, a retaliação.
A conduta dessa pessoa, segundo a Torá, deveria ser a de emprestar ou a de fazer o favor com o coração pleno, e não repetir o gesto do primeiro. Não se deve guardar mágoa em seu coração.
Segue o Rambam, dessa vez, elogiando o caráter de David Hamêlech, que disse: “Eu nunca me vinguei de alguém” (Tehilim 7:8).
Não guardar rancor
Todo aquele que guarda rancor de um yehudi transgride, também, uma mitsvá lo taassê.
Um exemplo de rancor, segundo o Rambam, é ilustrado pela história que se segue: Reuven pede para que Shim’on alugue sua casa para ele ou lhe empreste seu boi. Shim’on não o faz. Tempos depois, é Shim’on quem precisa de algo para alugar ou emprestar de Reuven. Como resposta, Reuven diz que tudo bem, mas acrescenta a seguinte frase - “Eu estou fazendo isso, porque não sou como você. Não vou pagar-lhe na mesma moeda”.
Aqui, se Reuven tivesse feito o aluguel ou o empréstimo a Shim’on, e tivesse permanecido calado, teria cumprido a mitsvá lo taassê de não se vingar. Mas, como, infelizmente, não o fez, transgrediu a mitsvá que proíbe guardar rancor.
Quem se comporta dessa maneira, tem de apagar isso do coração. Enquanto guardar rancor, o indivíduo pode chegar a revidar, explica o Rambam. Assim, uma transgressão pode acabar levando a outra.
Por isso a Torá condena que se tenha e se nutra rancor. A conduta correta, portanto, é apagar completamente qualquer traço de rancor do coração, até que não se lembre mais dele.
Esta é uma virtude que torna possível, ou melhor, fabuloso, que se estabeleça de forma estável o convívio, o comércio e o trato entre as pessoas.