
Efráyim era um sujeito que possuía duas casas. Ele morava em uma delas. A outra estava alugada para inquilinos.
Em certa oportunidade, os inquilinos mudaram-se para outra casa maior.
Como Efráyim estava necessitando de dinheiro para investir em seus negócios, aproveitou a oportunidade para tentar vender a casa.
Perguntou para alguns conhecidos se eles conheciam algum corretor no bairro e recebeu a indicação de um deles, chamado Beni.
Efráyim telefonou para Beni e contratou-o para vender sua casa, combinando uma comissão no caso de a venda se concretizar.
Após três semanas, Beni levou até Efráyim um cliente que desejava comprar a casa e que tinha oferecido novecentos mil por ela.
Efráyim recebeu Beni e seu cliente para tentarem fechar o negócio.
Após uma breve conversa, Efráyim concordou com a quantia oferecida pelo cliente, fecharam o negócio e assinaram um contrato.
No dia seguinte à venda, Efráyim se encontrou com um amigo seu, chamado Levi, no supermercado. Como já fazia algum tempo que eles não se encontravam, começaram a conversar sobre vários assuntos.
Durante a conversa animada, surgiu o tema da venda da casa. Efráyim comentou que estava contente porque vendera sua casa no dia anterior por novecentos mil. Imediatamente Levi perguntou por que Efráyim se recusara a vender a casa para ele por novecentos e cinquenta mil, conforme tinha oferecido.
Surpreso, Efráyim disse que não ficara sabendo da oferta de Levi pois, do contrário, certamente teria fechado com ele!
Após uma breve averiguação dos fatos, Efráyim descobriu que o comprador tinha oferecido uma “comissão extra” ao corretor Beni, para que ele lhe desse prioridade no negócio. Foi por isso que Beni levou este cliente, e não Levi, para fechar o negócio com Efráyim.
Ciente dos fatos, muito chateado, Efráyim quer anular a venda da casa, alegando ter sido uma venda equivocada (mêcach taut), e quer vendê-la para Levi, que lhe ofereceu mais dinheiro.
Efráyim tem este direito?
O Veredicto
Neste caso, a venda da casa não é considerada uma transação equivocada. O vendedor escutou o preço oferecido e viu o comprador, não havendo engano em relação à venda.
Houve sim um engano na história, mas foi algo paralelo à venda. Se Efráyim soubesse que seu amigo Levi estava interessado em pagar mais, é óbvio que venderia a casa para ele! Quanto a isso, ele foi enganado. Mas a venda para o cliente de Beni foi legítima.
Prova disso é o seguinte caso que o comentarista Ran (no Rif) cita na Guemará no Tratado de Kidushin:
Alguém que diz para outro sujeito: “Vá até onde se encontra fulana e tome-a para mim como noiva (faça kidushin para mim)”. O enviado vai até a moça mas, em vez de realizar sua missão, toma-a para si mesmo como noiva. Neste caso, apesar de o enviado não desempenhar sua função corretamente, o ato que fez é válido e a moça torna-se noiva (mecudêshet) dele. O que foi feito valeu, mesmo que tenha sido realizado de má fé.
Sobre este caso, o comentarista Ran faz a seguinte observação: “Mas é óbvio que o ato é válido! Por acaso o noivado não estaria válido somente porque o enviado agiu de má fé?” E responde qual poderia ser o problema neste episódio: Poderíamos pensar que o noivado foi um engano já que, se o indivíduo soubesse que seu enviado não iria cumprir com sua função, não o teria enviado. Poderíamos imaginar que a ação do enviado deveria ser desconsiderada, uma vez que o indivíduo que enviou o mensageiro foi enganado. É por isso que se faz necessário dizer que, mesmo assim, não se invalida a ação, e que o noivado está de pé.
No nosso caso aconteceu o mesmo. Apesar de ter havido má fé por parte do corretor, a venda da casa não é cancelada. O dono da casa foi enganado - como o indivíduo que enviou o mensageiro no caso da Guemará - mas a transação foi válida apesar disso. Ou seja, na própria transação não houve qualquer engano.
No entanto, apesar de a venda não ter sido cancelada, é plausível dizer que o bêt din (o tribunal judaico) deve tirar parte da comissão recebida por Beni e devolvê-la a Efráyim, já que Beni agiu de má fé com ele, não merecendo receber toda a comissão combinada.
Do semanário “Guefilte-mail” ([email protected]).
Traduzido de aula ministrada pelo Rav Hagaon Yitschac Zilberstein Shelita Os esclarecimentos dos casos estudado no Shulchan Aruch Chôshen Mishpat são facilmente mal-entendidos. Qualquer detalhe omitido ou acrescentado pode alterar a sentença para o outro extremo. Estas respostas não devem ser utilizadas na prática sem o parecer de um rabino com grande experiência no assunto.