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Hagaon Rav Shach z"l

"Um pouco da história do gaon que foi o rav da maioria

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Rav El’azar Menachem Man Shach zt”l nasceu na cidade de Waboilnik, Lituânia, na véspera de Rosh Chôdesh Shevat 5655 (1895). Seus pais, Rav Azriel zt”l e a Sra. Bat Sheva a”h, irmã de R. Asher Nissan Levitan zt”l, eram muito tementes a D’us, sendo que seu filho sempre contava:

“Lembro-me bem de como fui educado na casa dos meus pais; quando a kipá caía de minha cabeça, deveria-se chorar de tristeza. Certa vez, acordei após o horário de Keriat Shemá (de acordo com o Maguen Avraham); explodi em lágrimas e chorei o dia inteiro.”

Foi assim que ele cresceu e foi educado. Durante toda a sua vida temeu a Justiça Divina e cumpriu as mitsvot minuciosamente.

Embora em sua cidade, Waboilnik, houvesse uma yeshivá, Rav Shach queria muito estudar na yeshivá de Ponevidj. Seus pais acabaram concordando; desde então, nunca mais os viu.

Na yeshivá de Ponevidj, dedicou-se aos estudos junto ao seu grande professor, Rabi Itshe’le Blazer zt”l. Já em sua juventude, destacava-se pelas qualidades que o acompanharam a vida toda: perseverança maravilhosa nos estudos, talentos brilhantes, nobreza de espírito, bondade, respeito ao próximo e simpatia a todos.

Continuou seus estudos na yeshivá de Slobodka e logo ficou famoso como um de seus melhores alunos. Durante os anos de 5673-5674 (1912-1913), estudou com o grande Saba de Slobodka e com o Gaon Harav M. Epstein zt”l.

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Em 5674 (1914), teve de deixar a yeshivá de Slobodka, em consequência da guerra. Dirigiu-se, então, para sua cidade natal, onde estudou com o Rav Yechezkel Bernstein zt”l. Nessa época, sofreu muito: conseguiu escapar dos terrores da Primeira Guerra Mundial, mas teve que perambular de cidade em cidade, sem saber onde estavam seus pais. Apesar disso, nunca abandonou seus estudos. Quando, mais tarde, seus alunos reclamavam da difícil situação material na yeshivá, ele lhes contava que, na época em que perambulava de cidade em cidade, lavava seu rosto, mãos e pés nas pias que havia em frente às sinagogas ou casas de estudos. Tirava sua camisa, lavava-a na pia e ficava do lado de fora, até que esta secasse. “Eu nunca quis depender da bondade dos outros”, dizia. Costumava dizer que aqueles que estão atados às necessidades materiais, jamais atingirão níveis elevados de espiritualidade.

Depois de um tempo, foi estudar na yeshivá de Slotsk, com o Rav Isser Zalman Meltser (autor de “Êven Haazel”). Lá chegando, teve que entrar na sala do professor para ser testado. Envergonhado com suas roupas gastas e rasgadas, virou suas calças de forma que o lado de trás, que estava menos gasto, ficasse na frente. Rav Meltser percebeu; aceitou-o de bom grado à yeshivá, prevendo que aquele sábio rapaz seria um grande homem, e já no dia seguinte, comprou-lhe roupas novas. Foi-lhe bondoso como um pai. Depois de muito estudo, Rav Shach recebeu a “semichá” do Rav Meltser, que entrementes fundara uma yeshivá em Kletsk. Rav Shach casou-se então com a sobrinha de seu mestre, entre Yom Kipur e Sucot do ano de 5684 (1924). Durante toda a sua vida, pôde dedicar-se aos estudos sem preocupações, graças à sua querida esposa Gutl a”h, que tomou sobre si a preocupação de sustentar a casa.

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Rav Shach estudou com afinco durante cinco anos, purificando-se e mergulhando cada vez mais fundo no Talmud. No ano de 5689 (1929) foi convidado pelo Rav Aharon Kotler zt”l para trabalhar ao seu lado e ser rosh metivta da yeshivá de Kletsk. Lecionou lá durante cinco anos. Então, foi chamado pelo Rav de Brisk para exercer o cargo de rosh yeshivá na Yeshivat Torat Chayim, como substituto do Rav Sokolovski zt”l (autor do Imrê Moshê), mas por algum motivo, o projeto não foi levado adiante.

Depois do falecimento repentino do Rav Meir Shapira zt”l, foi convidado pelo Rav Chayim Ozer zt”l para dirigir a yeshivá de Lublin, lá permanecendo por um curto período.

Mais tarde, dirigiu a yeshivá de Novardok por dois anos. No ano de 5696 (1936), dirigiu a yeshivá de Karlin, em Lolinez, cujo líder era Rabi Avraham Elimêlech Perlov zt”l.

Este episódio foi particularmente interessante: certa vez, os grandes líderes espirituais da Lituânia e da Polônia reuniram-se em uma importante conferência. De repente, no meio da reunião, um rapaz irrompeu para dentro da sala e, sem olhar para os lados, correu para o grande Rav Chayim Ozer zt”l e disse: “Em relação à pergunta de ontem, há uma resposta simples.”

Um dos grandes rebes levantou-se e ralhou com ele: “Rapazinho, um pouco de educação!” O rapaz pediu desculpas aos presentes e retirou-se. Depois que saiu, o Rav Chayim Ozer sorriu aos participantes e disse: “Esse rapaz, quando tem uma pergunta ou uma resposta sobre os estudos, não sabe de mais nada, portanto não há por que ficarem contrariados.”

O Rebe de Karlin, que também estava presente naquela ocasião, dirigiu-se ao Rav Chayim Ozer e disse: “Se é assim, é de um rosh yeshivá como este que eu estou precisando.” O desejo do Rebe de Karlin foi satisfeito, e o Rav Shach acabou dirigindo a yeshivá de Karlin por quatro anos.

No ano de 5700 (1939-40) chegou a Vilna, onde permaneceu por algum tempo ao lado de seu querido professor, Rav Chayim Ozer. Neste mesmo ano, sua filha Miriam Reizl faleceu. Ele contava: “Desde então, sempre que me encontrava com Rav Chayim Ozer, ele me consolava, dizendo que o estudo da Torá distrairia minha dor. Ele também perdera sua filha única”.

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Durante o enterro, Rav Chayim Ozer segurou o filho do Rav Shach, Efráyim, no colo, brincando com ele e acalmando-o.

No ano de 5700 (1940), Rav Shach subiu para a Terra de Israel. Chegou lá de mãos vazias, pois confiscaram-lhe tudo na fronteira. “Naquela época”, contou ele, “fui convidado para dirigir uma yeshivá em Tel Aviv. Ganhei um bom salário, com o qual comprei estes móveis que vocês estão vendo - que me acompanham desde então - e aluguei um apartamento no centro de Tel Aviv.”

Por instrução do Chazon Ish, no entanto, Rav Shach acabou demitindo-se da yeshivá de Tel Aviv e foi chamado pelo Rav Ben Tsiyon Bruk para dirigir sua yeshivá “Bêt Yossef Birushaláyim”, onde lecionou de 5701 (1941) a 5704 (1943).

Em 5704 (1944) tornou-se rosh yeshivá da Yeshivá Kletsk, em Rechovot, fundada pelo filho de seu professor, Rav Meltser. Mais tarde voltou a lecionar lá, entre os anos 5710 (1949) e 5711 (1950).

Em 5705 (1954) tornou-se rosh yeshivá da yeshivá de Lomja, em Petach Ticva, fundada pelo Rav Yechiel Mordechay Gordon.

Finalmente, em 5711 (1950), foi chamado pelo Rav Ponevidj zt”l para dirigir a yeshivá de Ponevidj, em Benê Berak. Lá lecionou por cinco décadas, marcando profundamente dezenas de milhares de alunos que por lá passaram. Com amor paternal e com fala macia, conseguiu penetrar nos corações dos seus alunos e impregná-los com temor a D’us e amor por Sua Torá, sendo sempre um exemplo do que exigia. Ensinava Torá com fervor e ânimo, aprofundando-se muito na explicação de cada passagem do Talmud. Muitas vezes, depois de todas as aulas que dava em sua yeshivá, ainda viajava até a yeshivá de Grodna, em Ashdod, ou à Yeshivá Porat Yossef, em Yerushaláyim, para dar aulas.

Suas aulas foram compiladas nos seus livros chamados “Avi-Ezri”, que foram impressos em algumas edições.

Quando o Rav Shach terminou seu livro “Avi-Ezri” sobre o Rambam, levou-o para seu grande amigo, o Rav de Brisk. Eles já se conheciam da Europa, quando Rav Shach visitara a cidade de Brisk. O Rav de Brisk comentou, sobre o encontro: “Desde o falecimento de meu pai, de abençoada memória, não tive o mérito de aprofundar-me na Torá como naquela conversa”. Portanto, depois de deliciar-se com as novidades que o Rav Shach lhe apresentava naqueles livros, escreveu uma carta de recomendação repleta de elogios e de expressões de apreço. O Rav Shach leu a carta e enfiou-a dentro do seu bolso apressadamente. Depois de retirar-se, o Rav de Brisk ficou pensando sobre o estranho gesto de seu amigo e acabou chegando à conclusão de que este não pretendia imprimir aquela carta. Mandou então seu filho, Rav Yossef Dov Soloveitchik zt”l, até o Rav Shach, com as seguintes palavras: “A carta foi escrita para ser impressa”. Rav Shach respondeu ao filho: “Mas eu não fui até lá para receber esta carta; eu simplesmente queria saber se seu pai aprovava o que escrevi e, uma vez que ele aprovou, é o bastante para mim. Para que devo, então, imprimir a carta?” Mas o filho insistiu, dizendo que seu pai fazia questão de que a carta fosse impressa juntamente com o livro. E assim foi.

Com o falecimento dos eruditos da geração passada, o Rav Shach tornou-se um líder dos nossos dias, particularmente no universo de Torá, assumindo responsabilidades de um guia espiritual, por dezenas de anos.

Sua voz foi ouvida em todas as batalhas públicas na defesa dos princípios do judaísmo, levantando-secontra os deturpadores dos caminho da Torá.

Foi um mestre para todos. Na modesta sala em sua casa, perto da yeshivá, foram deliberadas resoluções da maior importância. Juntamente com os assuntos públicos, sempre esteve atento aos sofrimentos de cada indivíduo, sentindo as dores de cada um que procurava por seu auxílio, distribuindo bons conselhos, palavras de encorajamento e de consolo, até mesmo ajudando na prática com todas as suas possibilidades.

Apesar de suas atividades públicas, não se descuidava de sua obrigação central, dedicando-se com afinco ao estudo e ao ensino da Torá. Mesmo nos dias mais agitados, quando tempestades pairavam no ar e muitos aportavam em sua casa em busca de orientação, não cancelava suas aulas e mergulhava profundamente em seus estudos.

Com seu desaparacimento, nossa geração perdeu um grande mestre, o coração da nação, único em seu tempo, a coluna vertebral do povo de Israel, que carregou o povo sobre seus ombros e tomou-o em seu regaço, como se leva uma criança.

Estamos todos órfãos.

Que seu mérito nos proteja!

Resumido do “Yated Neeman”