Matérias >> Edição 172 >> Visão Judaica I

Cada Fio de Cabelo

Há um versículo no livro de Mishlê no qual o Rei Shelomô diz (3:12): “Ki et asher yeehav Hashem yochíach uch’av et ben yirtsê - Porque Hashem, a quem ama repreende, assim como um pai que ao filho quer bem”.

Certa vez, Rav Meir Chadash, o rosh yeshivá de Chevron, perguntou para um aluno qual é a diferença entre a yeshivá ketaná (para crianças menores) e a yeshivá guedolá (para jovens acima de 16 anos). Então ele mesmo respondeu mais ou menos assim: “Quando uma criança na yeshivá ketaná não recebe reclamação, significa que está se saindo bem. Na yeshivá guedolá, quando um jovem não ouve reclamações, significa que não se espera dele muita coisa”.

Na yeshivá guedolá, já se pode começar a perceber as intenções dos jovens com mais clareza, como eles pretendem construir seu futuro. Portanto, quando os mestres percebem que há boas características em um determinado jovem, que ele tem um coração puro desejoso de altos níveis espirituais, acompanham-no mais de perto, realizando maiores análises e cobranças. É deste tipo de aluno que os professores esperam melhores resultados.

De forma análoga a este raciocínio, o versículo citado em Mishlê transmite a ideia de que Hashem repreende com mais firmeza aqueles que Ele mais ama.

Por vezes, pessoas que começam a fazer teshuvá vêem-se num dilema. Por algum tempo, desde que decidem se aproximar de D’us, sentem-se mais reprimidas e não entendem o porquê de estarem sendo “advertidas”. Agora que decidiram consertar sua conduta, o esperado seria receber prêmios e não sofrimentos...

O que acontece, de fato, é que, estando mais próximas de Hashem, Ele passa a olhar estas pessoas mais “de perto”. Esperando indicar o melhor caminho e, também, cobrando os atos passados, Hashem envia algum tipo de corretivo. Com isso, Hashem “limpa” o passado e indica o melhor caminho, preparando um grande futuro para estes filhos queridos.

É assim que se deve encarar um período de admoestação Divina com sofrimentos - como uma reprimenda de Alguém que está próximo e anseia uma melhora da pessoa, caso contrário nem se dirigiria a ela.

Neste mesmo contexto, também é famoso o conceito de que Hashem cobra os mínimos deslizes dos atos dos tsadikim - mesmo um erro “da espessura de um fio de cabelo”.

Sendo assim, então, surge uma questão paradoxal: “Qual a ‘vantagem’ de ser um tsadic? Parece mais perigoso do que recompensador!”

Este enigma deve ser encarado como as cobranças aos bons alunos da yeshivá guedolá. A resposta desta interrogação também é a mesma que a dos que fazem teshuvá e vêem-se num dilema - por algum tempo censurados por seus atos. A cobrança ao tsadic é, na realidade, um grande benefício. Ao mesmo tempo que Hashem imediatamente “limpa” os defeitos da alma do tsadic, mostra-lhe o caminho correto a ser retomado.

Ainda assim - alguns poderiam afirmar - parece ser mais confortável não ser um tsadic e não estar sujeito a estas “admoestações”.

Mas este tipo de afirmação pressupõe uma injustiça Divina - que somente o tsadic recebe correções. E isto seria ilógico. A verdade é que o tsadic recebe suas correções e a limpeza de sua alma neste mundo, onde elas são muito mais suportáveis. Já o perverso, ao contrário, pode receber a recompensa pelos atos bons que realiza neste mundo, mas “após seus 120 anos”, terá que prestar contas por seus atos nos mínimos detalhes - por cada deslize, tanto os maiores quanto os mais ínfimos. Enquanto isso, o tsadic, já limpo de suas manchas, certamente desfrutará dos imensos prazeres espirituais prometidos pelo Todo-Poderoso.