Matérias >> Edição 174 >> Educação II

Mãe Má

Dr. Carlos Hecktheuer, Médico Psiquiatra

Um dia, quando meus filhos forem crescidos o suficiente para entenderem a lógica que motiva os pais e mães, eu hei de dizer-lhes:

Eu os amei o suficiente para sempre perguntar a vocês aonde vão, com quem vão e a que horas regressarão.

Eu os amei o suficiente para não ficar em silêncio e fazer com que vocês soubessem que aquele novo amigo não era boa companhia.

Eu os amei o suficiente para fazê-los pagar as balas que tiraram do supermercado e dizer ao gerente: “Nós pegamos isto ontem e gostaríamos de pagar”.

Eu os amei o suficiente para ficar em pé ao lado de vocês, uma hora, enquanto limpavam o seu quarto - tarefa que eu faria em menos de dez minutos.

Eu os amei o suficiente para deixá-los perceber, além do amor que eu sentia por vocês, eventuais desapontamentos e também as lágrimas nos meus olhos.

Eu os amei o suficiente para deixá-los assumir a responsabilidade das suas ações, mesmo quando as penalidades eram tão duras que me partiam o coração.

Mais do que tudo, eu os amei o suficiente para dizer-lhes “não”, quando eu sabia que vocês poderiam me odiar por isso - e em alguns momentos até me odiaram.

Essas eram as mais difíceis batalhas. Mas estou contente, venci!... Porque no final vocês venceram também!

E em qualquer dia no futuro, quando meus netos forem crescidos o suficiente para entender a lógica que motiva o comportamento dos pais e mães; quando eles lhes perguntarem se sua mãe era má, vocês, meus filhos, vão lhes dizer:

“Sim, nossa mãe era má. Era a mãe mais má do mundo...

“As outras crianças comiam doces e guloseimas no café e nós tínhamos que comer cereais, ovos, torradas.

“As outras crianças bebiam refrigerantes, comiam batatas fritas e sorvetes no almoço, enquanto nós tínhamos que comer arroz, feijão, carne, legumes e frutas.

“Ela insistia em saber onde estávamos a toda hora. Mamãe tinha que saber quem eram nossos amigos e o que fazíamos com eles.

“Ela insistia que lhe disséssemos com quem sairíamos, mesmo que demorássemos pouco tempo para voltar.

“Quando éramos adolescentes, ela conseguia até ler os nossos pensamentos...

“Muitas vezes pensávamos que nossa vida era mesmo chata!

“Ela não deixava os nossos amigos simplesmente tocarem a buzina do carro para que saíssemos; tinham que subir, bater à porta para ela os conhecer.

“Enquanto todos podiam voltar tarde da noite com doze anos, tivemos que esperar pelos dezesseis para chegar um pouco mais tarde, e ela ainda se levantava para saber se a festa foi boa - só para ver como estávamos ao voltar.

“Por causa de nossa mãe má nós perdemos grandes experiências na adolescência: Nenhum de nós se envolveu com drogas, com roubo, com atos de vandalismo, com violação de propriedade, nem fomos presos por nenhum crime!

“Foi tudo por causa dela!

“Agora que já somos adultos, honestos e educados, estamos fazendo o máximo para sermos ‘pais maus’, como foi nossa mãe.”

Um dos grandes males do mundo de hoje é que não há suficientes mães más!