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Uma Lição dos Sapos

Jaques Menaged

Visão Judaica I

Durante o segundo império Babilônico, o Imperador Nabucodonosor mandou erigir em sua honra uma gigantesca estátua de sua imagem. Quando ela foi terminada, ofereceu uma grande festa. Neste banquete, mensageiros de todo o mundo, de todos os povos conquistados, deveriam se ajoelhar perante sua imagem.

Os mensageiros judeus escolhidos foram os sábios Chananyá, Mishael e Azaryá. Se não cumprissem a ordem do imperador, os sábios corriam o risco de serem queimados vivos. Cientes do perigo, mas dotados da inabalável fé do Povo Judeu no D’us Único, que proíbe prostrar-se frente a qualquer imagem, Chananyá, Mishael e Azaryá se dirigiram aos sábios do Grande Sinédrio. Fizeram a seguinte pergunta: “Se eles fossem à festa e não se ajoelhassem, D’us os salvaria do fogo como fez com Avraham, ou eles deveriam fugir e não comparecer ao evento?” Os anciões responderam que, uma vez que tinham a opção de fugir, se insistissem em comparecer, D’us não os salvaria no caso de uma punição por parte do imperador.

Baseando-se numa passagem da Torá, os três sábios fizeram um cálculo lógico e resolveram comparecer. Durante a segunda praga no Egito, D’us disse (Shemot 7:28): “E o Nilo multiplicará rãs, e subirão, e virão à tua casa e entrarão no teu quarto de dormir e sobre tua cama e na casa de teus servos e no teu povo e nos teus fornos e nos teus restos de provisões”.

Os sábios pensaram: “Durante a segunda praga no Egito, para cumprir a palavra do Eterno e santificar o Seu nome, os sapos entraram nos fornos dos egípcios. Como então nós, que somos Seus filhos, não santificaremos também o Seu Nome?”

Decididos, Chananyá, Mishael e Azaryá foram à festa. Quando todos se ajoelharam eles permaneceram de pé. Ao assistir a esta cena, o imperador ordenou que somente os três se ajoelhassem para a estátua perante todos os presentes. Novamente eles se negaram. Nabucodonosor mandou então que eles fossem atirados ao fogo, e assim foi feito. Contudo, D’us fez um milagre e nada aconteceu a eles. O imperador, dando-se conta da grande maravilha, encheu-se de temor, libertou-os e deixou-os ir.

Em alusão a este episódio, na oração de Selichot, pedimos a D’us que nos ouça e nos atenda, assim como atendeu a estes três grandes personagens. Dizemos: “Deanê Lechananyá, Mishael Vaazaryá begô atun nurá yakidtá, anenan - Quem atendeu a Chananyá, Mishael e a Azaryá no fogo incandescente, que nos atenda”.

Esta bela passagem da história de nosso povo exige algumas explicações. Qual o cálculo lógico que fizeram os sábios? Afinal, a situação deles não era a mesma que a dos sapos! Os sapos somente se sacrificaram porque estavam obedecendo à ordem do Criador de entrar nos fornos dos egípcios. Quanto aos sábios, não havia nenhuma ordem para que eles se sacrificassem! Eles, os sábios, poderiam perfeitamente ter fugido, conforme lhes haviam recomendado os sábios do San’hedrin.

A resposta é simples. A ordem de D’us no Egito não foi para cada sapo, em particular, que fosse a determinado lugar. A ordem foi para todos os sapos, em geral, que entrassem em todos aqueles lugares - quartos, camas, fornos... Cada sapo poderia escolher onde entrar. Mesmo assim, alguns resolveram entrar nos fornos para que a ordem de D’us fosse completamente satisfeita. Portanto, os sapos que entraram nos fornos também tinham uma opção de não se sacrificar.

Além disso, os sábios pensaram: “Se fugirmos, apesar de conseguir salvar nossas vidas sem praticar idolatria, todos os povos ficarão sabendo que a festa foi um sucesso. As pessoas comentarão que representantes de todos os povos se ajoelharam perante a estátua do imperador. Não saberão que os judeus não se ajoelharam e não farão menção especial ao nosso povo. Sendo assim, todos pensarão que também os judeus se prostraram. Isso será uma profanação do Nome de D’us”.

Chananyá, Mishael e Azaryá queriam mostrar que um judeu nunca se ajoelha para uma estátua, pois estaria renegando um dos mandamentos de D’us. Queriam que todos soubessem disso. Estavam dispostos a entregar suas vidas para santificar o Nome Divino, não deixando dúvida alguma de que a Sua lei estava sendo cumprida.

Foi por causa deste pensamento puro que, apesar de terem contrariado o decreto do San’hedrin, os três grandes sábios foram salvos do fogo.

Nesse mesmo contexto, é interessante ressaltar um outro comentário de nossos sábios sobre a praga dos sapos. Quando terminou a praga, todos os sapos morreram, com exceção daqueles que tinham entrado nos fornos.

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Desta passagem aprendemos quão grande é a mitsvá de kidush Hashem - a santificação do Nome de D’us - pela qual se pode até colocar a vida em risco. O milagre de entrarem no fogo e saírem ilesos demonstra o grande mérito destes que a cumprem.

Hoje não é necessário arriscar a vida para fazer kidush Hashem. Quando um judeu vive honestamente e, ao observá-lo, outras pessoas dizem que a proximidade da Torá e das mitsvot é que faz dele um homem íntegro, está cumprindo plenamente esta grande mitsvá de santificar o Nome de D’us no mundo.