Vivendo com Significado
Rabino Moshe Meir Weiss
Sobre o Autor

O Rabino Moshe Meir Weiss vem servindo como Rabino da organização Agudath Ysrael de Staten Island, Nova York, há quase vinte anos. Ele recebeu sua ordenação rabínica do Rabino Moshe Feinstein Z”TL, a quem teve o privilégio de servir e estudar por mais de dez anos. Desde 1978 ele tem diligentemente disseminado a Torá e seus valores através de milhares de fitas e CDs, bem como sua aparição em rádios e suas abrangentes palestras públicas. Seu talento como palestrante é legendário, bem como sua extraordinária capacidade de articulação. Platéias por todo o mundo desfrutam suas apresentações tanto do lado prático como do lado emocionante do Judaísmo.

O Rabino Weiss vem ministrando aulas de Daf Yomi [aulas diárias de Talmud, com vistas a concluir o estudo de todo o Talmud em sete anos e meio] para grandes audiências nos últimos três ciclos do Daf Yomi e, além disto, há mais de 10 anos está envolvido em projetos educacionais.

Escritor e palestrante muito requisitado, seus artigos podem ser encontrados semanalmente no The Jewish Press, bem como em outros jornais e revistas. Seus dois primeiros livros, “Passionate Judaism” e “Meaningful Living” (à disposição do público no site www.judaicapress.com) continuam extremamente populares, e tocaram as vidas de milhares de leitores por todo o mundo. Ano passado, com o lançamento de seu novo livro, “On the Yamim Noraim”, o autor vem se consagrando entre o público leitor.

Com seu estilo revigorante e direto, o Rabino Weiss oferece uma valiosa orientação e conselhos sobre virtualmente qualquer aspecto da vida Judaica. Neste encantador livreto, o Rabino Weiss revela em três artigos a beleza por trás dos costumes e observâncias do Judaísmo. Baseado no provérbio Talmúdico de que “D'us deseja o sentimento de nossos corações”, ele nos orienta em relação aos desafios que enfrentamos em nosso dia a dia, bem como traz sugestões práticas para Rosh Hashaná e Yom Kipur.

Os leitores se sentirão cativados pela escrita dinâmica e sua capacidade de abordar questões mais complicadas. A intenção deste trabalho é ampliar nossos horizontes e verdadeiramente ajudar cada um a encontrar o caminho para Uma Vida Repleta de Significado..

Boa leitura!

Tornando-nos Pessoas Melhores

Se examinarmos toda a Torá, perceberemos que não há muitas pessoas que receberam tantos elogios de D’us como Noach (Noé). Ela se expressa com grande reverência sobre o caráter de Noach, descrevendo-o como um Tzadic (uma pessoa pia), idôneo e que andava nos caminhos de D’us. Mais ainda, a Torá o classifica como “Ysh”, o equivalente à famosa expressão em idish: “Mentsh” (um sujeito íntegro).

Acima de todas essas qualidades, existe uma característica de Noach que precedeu todas as demais. A porção da Torá se inicia com a seguinte frase: “Estas são as gerações de Noach, ele era Noach”. Esta curiosa expressão foi explicada pelos comentaristas do Talmud [Baalei Tosfot, França e Alemanha, que viveram entre os anos 1100 e 1300] como significando que ele era uma pessoa gentil e boa.

O Todo-Poderoso tem a característica da bondade em tão alta estima que Ele a precedeu sobre todas as outras virtudes de Noach. Esta é uma lição de profunda importância para nós. Em idish nós nos referimos a uma pessoa bondosa como “eidele mentsh”. Esta é uma característica maravilhosa para se procurar num possível cônjuge e, por consequência, uma virtude importante a se cultivar em si mesmo.

Entretanto, devido à correria frenética da vida moderna, esta não é uma tarefa fácil. A competitividade no ambiente de trabalho e as milhares de obrigações conflitantes que recaem sobre nós diariamente não são a matéria-prima apropriada para desenvolvermos a característica da bondade. Muitas pessoas que adentram o casamento já vêm tensas e com baixo nível de tolerância – mesmo antes de o primeiro filho nascer e as pressões reais sobre a família começarem a se acumular.

Infelizmente, os rigores e dificuldades das muitas provas que nossos filhos encontram nas escolas e faculdades já os colocam numa ‘panela de pressão’ desde uma idade muito tenra. Os educadores, por seu lado, andam sobre uma corda bamba, pois sem os incentivos das provas, o nível de desempenho nas escolas provavelmente cairia. Precisa haver, entretanto, um meio termo feliz: as crianças precisam evoluir e demonstrar esta evolução em seus estudos, porém sem chegar ao risco de úlceras por causa de uma overdose de livros, trabalhos e projetos.

Vejam que interessante: ao final da festividade de Sucót há uma outra festividade chamada Shemini Atseret. Nela há uma oração chamada Mussaf em que pedimos a D’us que mande chuva farta e bem distribuída para o novo ano que se inicia. Em meio a esta oração, o hazan (a pessoa que lidera a oração) menciona que o anjo encarregado das chuvas é conhecido como “Af-Beri”. Nossos Sábios explicaram que esta estranha composição de palavras, que significa em português “fúria-saúde”, se refere a dois tipos de chuva. A chuva pode cair como uma tempestade furiosa ou como uma ducha saudável e que promove a vida. Os comentaristas da Torá nos explicaram que a chuva, que em hebraico é chamada de “gueshem”, simboliza todo tipo de “gashmiut”, ocupações ligadas ao nosso sustento material. Portanto, o nome do anjo pode estar aludindo a duas possíveis situações de ‘chuva’: se há raiva no lar, a pessoa acabará vivenciando mais momentos de raiva e colhendo resultados infelizes – o atributo de “af” (raiva) – por parte do anjo encarregado de seu sustento. Por outro lado, se existe um relacionamento calmo e saudável em casa e todos trabalham com empenho para criar um ambiente harmônico e agradável, então o atributo “beri” (saúde) do anjo tomará a frente, com bênçãos de uma parnassá (sustento) saudável para toda a família. Isto é exatamente o que o Talmud nos ensina [Tratado Baba Metsia 59a]: “Honrem suas esposas para se tornarem ricos”. Ao se esforçar para haver paz e harmonia com sua esposa, D’us promete aos maridos fartura em seus negócios e empreendimentos!

O Rei Salomão, o mais sábio dos homens (Israel, 1034-976 A.E.C.), nos ensinou o seguinte em seu livro Mishlei [Provérbios 15:1]: “Uma resposta suave dispersa toda a raiva”. Nossos Sábios nos transmitiram que a maior coroa que alguém pode adquirir – acima da coroa da realeza, do sacerdócio e mesmo a coroa da Torá – é a coroa de um bom nome. A maneira de se adquirir esta ‘super’ coroa é conversando e lidando gentilmente com os demais, e trabalhar duro para exercer uma influência tranquilizante sobre as pessoas ao nosso redor.

Que D’us possa nos dar a ambição e o talento para adquirirmos a característica da bondade, e que por seu mérito possamos todos ser merecedores de todas as muitas bênçãos da vida, para nós, nossos familiares e amigos! Que sejamos todos inscritos e carimbados no Livro da Vida!

Yom Kipur: Inclinando a Balança

Ao chegarmos em Yom Kipur, estaremos pleiteando com D’us mais um ano de vida. Seguramente esta não é uma tarefa fácil. Neste dia tão importante, onde seremos julgados em relação ao nosso destino para o ano vindouro, precisamos mostrar a Ele que somos merecedores de mais um ano de vida, que realmente somos úteis e indispensáveis aqui na Terra. Que podemos fazer para aumentarmos nossas chances de termos um julgamento positivo em Yom Kipur?

O Talmud nos conta que D’us inicialmente cria todos os maridos e esposas em um corpo único. De fato, quarenta dias antes de sua concepção, uma voz celestial anuncia o futuro cônjuge desta criança [Tratado Sotá 2a]. Somos então pré-programados para complementar nossos cônjuges e é o desejo de D’us que vivamos nossas vidas com o nosso par predestinado. Assim sendo, mesmo que não estejamos ainda no nível de sermos merecedores de mais um ano de vida por méritos próprios, ao cumprirmos nossas responsabilidades matrimoniais estaremos dando a D’us uma forte razão para nos enxergar como pessoas indispensáveis. Seguramente é uma enorme defesa no dia do julgamento prometermos a D’us que no ano vindouro tornaremos a vida de nosso cônjuge verdadeiramente mais doce, feliz e significativa.

Isto é o que o Talmud quis nos ensinar quando nos informou que Nadav e Avihu (os dois filhos de Aharon, irmão de Moshe, que faleceram tragicamente durante a inauguração do Tabernáculo no deserto) faleceram porque não eram casados e nem tinham filhos. Por outro lado, isto é realmente intrigante, já que a própria Torá nos conta, explicitamente, que eles morreram porque trouxeram uma oferenda que D’us não os tinha ordenado. Surge uma pergunta obvia: eles morreram por causa da oferenda não solicitada ou por não terem constituído uma família? Os comentaristas da Torá explicaram esta charada apontando que o erro realmente foi o de trazer um fogo indesejável. Entretanto, se fossem casados, suas esposas os teriam salvo. Se tivessem filhos, eles os teriam salvado. Nadav e Avihu seriam tão necessários para suas famílias que D’us não os teria levado embora.

Este é o conselho que o livro Orhot Haim, escrito pelo Rabino Asher ben Yehiel (Alemanha, 1250 - Espanha, 1328), mais conhecido pelo acrônimo de Rosh, oferece: “Aquele que quer ter vida longa deve tentar ter muitos parentes e amigos”. Ou seja: quanto mais nos fizermos necessários neste mundo, mais ‘garantida’ nossa vida se tornará, pois mesmo que não mereçamos viver por diversas razões, de qualquer maneira essas outras pessoas não merecem nos perder. Embora não falte a D’us ajudantes confiáveis, não há como repor completamente um pai ou mãe biológicos, uma criança querida ou um cônjuge atento e auxiliador.

Assim sendo, cada marido deve cuidadosamente repensar se está preenchendo as necessidades de sua esposa de forma adequada. Por exemplo: o Talmud no Tratado Pessahim [109a] nos informa que as roupas dão uma alegria especial às mulheres. Logo, um marido sábio será esperto em não perder a oportunidade de prover alegria à sua esposa desta maneira, comprando-lhe uma roupa nova. Muitas pessoas tentam poupar todo o dinheiro ‘extra’ que ganham. O Yetser Hará (o instinto negativo existente em cada um de nós) usa isto como uma armadilha e nos ludibria a pensar que para nos sentirmos verdadeiramente seguros precisamos ter um grande ‘pé-de-meia’ guardado. Ele nos ilude a pensar que se pouparmos cada centavo extra, um dia seremos realmente ricos. Sendo assim, quando nossas esposas pedirem um vestido ou sapatos novos, nossa resposta não deve ser sempre “As coisas estão muito difíceis agora”, pois enquanto o dinheiro dorme por anos no banco, ele poderia estar sendo mais bem utilizado para proteger o seu dono. Se utilizarmos nossos recursos para tornarmos nossas esposas felizes, D’us verá quão necessários nós somos e nos manterá por aqui por mais tempo.

Já a esposa deve se perguntar se tem como melhorar nas áreas onde somente ela pode trazer alegrias ao marido, pois desta maneira estará se tornando verdadeiramente indispensável e cumprindo o seu papel de ser uma ‘ezer kenegdo’, uma companheira fiel e de ajuda ao seu marido.

De fato, durante os asseret ieimei teshuvá, os dez dias entre Rosh Hashaná e Yom Kipur, cada cônjuge deve pedir um ao outro não apenas desculpas, mas sugestões concretas de como tornar o outro mais feliz no ano vindouro.

Ao raciocinar sobre nossas crianças, devemos considerar como nos conectar com elas mais frequentemente, apesar da correria do dia-a-dia. Devemos conhecer qual o doce predileto de cada uma delas para lhes trazer ocasionalmente e, assim, gerar um brilho em seus olhos. Devemos tentar fazer um compromisso com o Todo-Poderoso de que iremos aumentar os nossos esforços em seguir nos passos de nosso Patriarca Avraham (Abraão) ao inculcar em nossos filhos a percepção e a consciência da existência de D’us.

Em relação aos nossos pais, nada melhor que visitá-los, telefonar e escrever para eles mais frequentemente. Eles não precisam morar em outro país para desfrutar de uma carta nossa. Um cartão postal enviado de um bairro para o outro pode ser bastante tocante e poderá ser lido e relido diversas vezes. Também nos asseguremos de que eles estão adequadamente vestidos para o inverno, que tenham alimentação e cuidados médicos apropriados e tudo o mais que necessitam.

Tentemos estar disponíveis para os nossos amigos. Tomemos a resolução de que toda vez que percebermos que um de nossos amigos ficou doente, iremos telefonar-lhe, pois sabemos o quanto nós próprios apreciamos uma ligação quando estamos nesta situação.

Falemos para o Todo-Poderoso: “D’us, não queremos que ninguém seja punido por nossa causa. Não queremos que ninguém seja colocado sob tensão, que perca o emprego ou fique deprimido porque talvez tenha nos prejudicado ou insultado. Estamos perdoando-os antes de Yom Kipur. Porém, com uma condição: estamos perdoando-os mesmo que não o mereçam. Então, D’us, por favor, o Senhor que retribui ‘medida por medida’ (ou seja, recebemos reciprocamente pelos nossos atos), perdoe-nos por nossas muitas falhas, mesmo que não o mereçamos”. Enterrando as picuinhas, superando os rancores e abolindo as brigas, tudo isto cria um ambiente para uma ‘medida por medida’ positiva, onde D’us, por Sua vez, nos perdoará e enterrará os nossos maus atos. Como o Talmud nos ensina: “Kol hamaavir al midotav, maavirim mimeno al col peshaav – Todo aquele que não dá atenção ao mal que outros lhe fizeram terá os seus pontos negativos removidos [Yomá 23a]”.

Ao chegamos ao início de mais um ano e proclamarmos D’us como o nosso Rei, devemos concomitantemente definir claramente nossa missão na vida. Primeiro, precisamos tentar ser mais conscientes diariamente de que somos súditos de D’us. É por esta razão que durante esta época recitamos duas vezes diariamente o Salmo 27, no qual o Rei David diz que “D’us é minha luz, meu guia, minha iluminação e o fator chave nas decisões diárias de minha vida”.

Ao vivermos desta forma, com a constante consciência de D’us e de Seu papel em nossas vidas, é um prazer para o Todo-Poderoso nos manter por aqui por um longo, longo tempo. Além de tudo, como dizemos nas bênçãos proferidas em todos os casamentos Judaicos: “D’us criou tudo para a Sua honra”. Se nos encaixarmos nos planos Divinos, com certeza Ele permitirá que continuemos por aqui.

O Talmud ensina que o sustento de uma pessoa é fixado em Rosh Hashaná [Beitsá 16 b]. Portanto, além da óbvia responsabilidade de rezarmos fervorosamente por uma ‘entrada’ anual adequada, também esta é uma época propícia para trabalharmos em incorporar em nossas mentes a atitude de que nossa parnassá (sustento) vem somente de D’us, e abraçar um estilo de vida que personifique esta visão.

Para ilustrar o que isto significa, permitam-me compartilhar com vocês uma bela parábola relatada pelo Maguid de Dubno, o Rabino Yaacov Krantz, o mais famosos dos Maguidim (oradores) da Europa Oriental (Polônia, 1741-1804). Ele contou a história de um pobre que estava caminhando com uma pesada sacola nas costas. Um homem rico passou com sua carruagem e ofereceu-lhe uma carona. Agradecido, o pobre subiu. Mas mesmo sentado, ele continuou com a pesada sacola nas costas. O cocheiro disse para ele, consternado: “Por que você está segurando este saco pesado? Coloque-o no chão!”. O pobre respondeu: “Já não é suficiente que estou ganhando uma carona? Não quero incomodá-lo com o peso da sacola, também!”. O homem riu e disse: “De qualquer maneira ela também está na carruagem. Pode colocá-la no chão e desfrutar sua carona!”.

O Maguid de Dubno concluiu: “O mesmo ocorre com os esforços da pessoa em ganhar seu sustento”. É lógico: não podemos ficar sentados dizendo que tudo o que deveria vir para nós virá de qualquer jeito, mesmo que não saiamos da cama. Pelo contrário, devemos fazer um esforço apropriado para conseguir o nosso sustento anual. Porém é tolice passar mais tempo trabalhando do que aquilo que D’us espera de nós. E como podemos saber quantas horas o Todo-Poderoso quer que trabalhemos? A resposta é: se trabalharmos longas horas e, como consequência, abrirmos mão de rezar com um minian (um grupo de dez pessoas), não ter um horário fixo para estudar Torá ou tempo para conversar e estudar com nossos filhos, além de dar atenção ao nosso cônjuge, esta é a indicação de que estamos levando nossos esforços longe demais. Além de tudo, D’us está nos dando ‘uma carona’ de qualquer maneira. Por que não abaixamos o nosso pacote e confiamos Nele? O Rei David já nos ensinou no Salmo 55 [23]: “Coloque sobre D’us o seu fardo e Ele o sustentará”.

Tomemos a resolução de passarmos mais tempo com a nossa família, mais tempo na sinagoga, mais tempo estudando e mais tempo ajudando os demais, e deixemos aquelas horas extras de trabalho para D’us tomar conta delas.

Sejamos pró-ativos ao chegar a Yom Kipur. O Talmud nos ensina [Shabat 32a]: “A pessoa deve sempre rezar para não ficar doente”. Não consideremos todas as coisas boas que D’us nos manda com algo garantido e imutável. Também é uma idéia maravilhosa que as pessoas orem umas pelas outras, como nos ensina o Talmud: “Todo aquele que pede misericórdia pelo próximo e que tem a mesma necessidade dele, suas preces serão atendidas primeiro [Tratado Baba Kama 92a]”.

De fato, eu faço questão de rezar pela saúde e o bem-estar de meus queridos leitores, por aqueles que precisam de cura, por aqueles que procuram um cônjuge, pelos que querem filhos, por aqueles que procuram sabedoria para lidar com os seus filhos, por aqueles que precisam de emprego, por aqueles que querem ter uma vida matrimonial mais feliz, pelos que precisam de paz de espírito e por todos que estão procurando um ano novo com boa saúde e prosperidade.

É minha esperança que todos vocês encontrem alguns minutos para fazer o mesmo por mim. Que sejamos todos inscritos e carimbados no Livro da Vida!

Um Pacote Completo: Criando Crianças Maravilhosas e...

O Rabino Avraham Pam Z”TL (EUA, 1913-2001) certa vez eletrizou uma enorme platéia com uma citação do grande Sábio, o Rabino Yaácov Ysrael Kanievsky (Israel, 1899-1985), conhecido como Steipler Rav. O Steipler recomendou os seguintes dois ingredientes para se criar crianças maravilhosas: cinquenta por cento de orações e cinquenta por cento de Shalom Bait (harmonia matrimonial). Imaginem! Apenas dois ingredientes!

Que mensagem crucial! Porém, como podemos traduzir este sábio conselho em atos?

Em nossas preces, o futuro de nossos filhos deve permear nossos pensamentos. Por exemplo: no Shemoná Esre (a parte principal das três orações que rezamos diariamente nas sinagogas), existe uma bênção em que pedimos por sabedoria, chamada Ata Honen La’adam daat (O Todo-Poderoso provê sabedoria à humanidade). Quão frequentemente usamos esta oportunidade para pedir que nossos filhos entendam melhor o que estão estudando? Não é impressionante que devemos levar em consideração que 50% do futuro de nossos filhos repousa sobre a qualidade de nossas preces, nas quais podemos pedir ao Todo-Poderoso por sua alegria e sucesso? Com este ‘mandato’ entregue pelo Steipler Rav, devemos nos condicionar a utilizar toda oportunidade para rezar por nossos filhos.

As mães devem rogar fervorosamente ao Criador por crianças boas e tementes a D’us. Uma hora especialmente propícia para isto é depois de acender as velas de Shabat. De modo similar, Shabat à noite, antes do Kidush, os pais devem abençoar seus filhos com uma prece do fundo de seus corações de que possam ser merecedoras de uma bênção tripla: proteção, graça aos olhos de D’us e paz.

Outro momento auspicioso para rezarmos pelas crianças é todas as manhãs, quando dizemos a Benção da Torá “Possamos nós, nossos filhos e netos, conhecer o Seu nome e estudar a Sua Torá com pureza...”. Nesta bênção podemos rogar a D’us que o Judaísmo seja doce para nós e nossa prole. Como este pedido é importante! Estamos pedindo a D’us que o estudo de qualquer coisa Judaica seja prazeroso e não um fardo. Pedimos que o estudo seja uma parte saborosa (Guishmak, em idish) do dia-a-dia de nossas crianças, pois se assim o for, podemos ficar razoavelmente confiantes que continuarão a estudar Torá quando ficarem mais velhas. Pedimos também que nossos descendentes tenham sempre Yrat Hashém (consciência da existência e da presença de D’us). (Pense por um instante! Quantas crianças Judias pelo mundo nem sabem o que a palavra ‘Hashém’ significa?!)

Este conceito de rezarmos e pedirmos ANTES de um problema surgir é altamente recomendável pelo Talmud. No Tratado Berahot [8a] somos ensinados a pedir antes que cheguem as horas de necessidade. Devemos até rezar para que na hora que saiamos deste mundo, que seja de uma maneira fácil.

Logicamente também devemos rezar fervorosamente para que nossas jovens crianças encontrem bons pares e possam ter filhos, e que nossos futuros netos sejam saudáveis. Aprendemos isto do dito talmúdico: “Toda pessoa deve sempre orar para não ficar doente!”. Novamente a ênfase é sobre a oração preventiva.

Uma boa comparação para este tipo de prece é o ato de colocar o cinto de segurança, algo que muitos não se preocupam até que seja tarde! Os riscos são muito grandes para deixarmos de levar em consideração estas medidas! Da mesma maneira que precisamos nos condicionar a colocar o cinto de segurança, precisamos aprender a rezar em antecipação!

Há uma prece que se faz diariamente, conhecida como ‘Uvá Letsion’. Num trecho dela pedimos para não nos esforçarmos a toa. O que quer dizer isto? Estamos pedindo a D’us que todo o trabalho duro que fazemos para conseguir o nosso sustento e criar nossa família possa gerar somente frutos positivos – que nossos filhos cresçam e tornem-se bons Judeus.

...Mantendo um Casamento Sadio

E o que fazer com os outros 50% da receita do Steipler Rav, ou seja, o Shalom Bait? Nem é necessário dizer que se formos interessados e afetuosos com nossos cônjuges, nossas crianças possivelmente se tornarão adultos interessados e afetuosos! Ao demonstrarmos paciência, exercermos a flexibilidade e soubermos como pedir desculpas e chegar a acordos, as crianças seguirão por este caminho. Entretanto, se gritarmos e brigarmos, elas farão uma triste inferência: Se Papai e Mamãe se comportam assim um com o outro (mesmo que são casados), nós com certeza podemos gritar e brigar com as pessoas que são apenas nossas amigas. Percebamos que estamos sempre numa ‘vitrine’ e aproveitemos a oportunidade para exercer nosso papel como pais e bons modelos de comportamento.

Mais um exemplo: perguntemo-nos as seguintes questões:

O quanto eu penso antes de reagir àquilo que o meu cônjuge fala (Será que paro por um segundo ou dois?)? Será que estou demonstrando interesse e preocupação? Estou sendo justo? Será que penso antes de dizer ‘não’? Será que presto atenção sinceramente?

Se percebermos que respostas positivas a estas questões não são parte de nosso comportamento normal, então felizmente há muito espaço para melhorarmos nosso relacionamento matrimonial!

Permitam-me compartilhar uma maravilhosa história com vocês. Quando o grande Sábio, o Rabino Shlomo Zalman Auerbach Z”TL (Israel, 1910-1995) falou no enterro de sua esposa, ele comentou que é de costume se pedir desculpas ao falecido. “Entretanto”, ele continuou, “por quarenta e quatro anos vivemos juntos e conforme o Shulchan Aruch (o Código de Leis Judaico) e não tenho nada para pedir perdão além do fato de não ter tido méritos suficientes para salvá-la da morte”.

O Rabino Ezriel Tauber (como relatado na revista Jewish Observer) relatou outra história sobre o Rabino Auerbach. Certa vez um aluno percebeu que o Rabino Shlomo Zalman sempre se penteava antes de entrar em casa. Quando o jovem o questionou sobre isto, o grande Sábio explicou que quando uma pessoa tem Shalom Bait (harmonia matrimonial), seu lar é abençoado com a presença Divina (Shehiná, em hebraico). Portanto, antes de entrar em casa, ele estava se preparando para cumprimentar a Shehiná que estava lá dentro!

O Talmud [Tratado Baba Metsia 59a] ensinou: “As bênçãos residem no lar de cada um de nos somente por causa de nossas esposas”. A prova que o Talmud traz para isto é que o nosso Patriarca Abraão foi ajudado por D’us em diversas ocasiões pelo mérito de Sara, sua esposa [Gênesis (Bereshit) 13:16].

Na porção da Torá que discute a sotá (uma esposa suspeita de ter cometido adultério), o versículo declara: “ish ish ki tistê ishtó – o homem, o homem cuja esposa se desviou [Bamidbar 15:14]”. O midrásh [Bamidbar Raba] – uma das explicações sobre a Torá – pergunta: Por que a Torá traz a palavra “ish (homem)” duas vezes? E explica que há ocasiões que um homem deve se comportar de um jeito e outras em que deve agir de uma maneira completamente diferente. O midrásh então elabora o seu ensinamento: se a esposa entornou acidentalmente o copo de vinho do marido, ele deve desviar o olhar. Se assim o fizer, está escrito sobre ele: “Eu (D’us) recompensarei substancialmente aqueles que Me amam [Provérbios (Mishlei) 8:21]”. Se ela derramou o seu óleo (o que nos dias de hoje seria comparado a um ‘apagão’) e ele releva o fato, o Todo-Poderoso diz: “Eu encherei os seus depósitos [Provérbios (Mishlei) 8:21]”. Se ela rasga suas roupas, ele deve olhar para o outro lado e D’us atenderá todos os seus pedidos! Por outro lado, se ela se comportar de maneira infiel, ele deve se levantar como um leão e levá-la até o Cohen (sacerdote), que tomará as devidas providências.

Aprendemos deste midrásh que quando nos abstemos de reagir com dureza frente a um ato de descuido, um ato feito sem pensar ou uma injustiça por parte de nossa esposa, D’us nos chama de “ohavay”, aquele que Me ama! Quando relevamos algum ato deste tipo por parte dela, estamos como que declarando que vale a pena evitar uma confrontação e uma briga, não importando o que aconteceu, com o intuito de manter a Shehiná (presença Divina) em nosso lar. O ímpeto por manter a Shehiná em nossas casas demonstra nosso amor pelo Criador.

Ademais, D’us promete que nunca diminuirá ou fará pouco caso deste comportamento. Pelo contrário, Ele responderá a todos os nossos pedidos por praticarmos este auto-controle com tanto empenho!

De forma inversa, quando a estrutura do lar está ameaçada por um comportamento infiel, é igualmente importante não olhar para o outro lado, mas sim tomar uma decisão firme, pois a Shehiná não pode residir num lar onde há imoralidade.

No Tratado Taanit [21], o Talmud relata que os discípulos perguntaram ao Rabino Ada bar Ahava por que ele teve o mérito de uma longevidade tão grande. Ele respondeu: “Leolam lo hikpadti b’toch beiti – Nunca agi de maneira que gerasse discórdia em minha casa!”. Devemos perceber que já que o Rabino Ada tinha a seu favor o fato de nunca ter se alterado em sua casa, isto sugere que provavelmente houve situações em que sim se justificaria ele ter se irritado. Caso contrário, ele não teria do que ter crédito a seu favor. Mesmo assim, com auto-domínio, ele olhou para o outro lado e isto o fez merecer algo que todos nós concordamos que vale a pena almejar: a dádiva da vida longa!

De fato, o livro Keren Orá, ao analisar este trecho do Talmud, elucida de uma forma muito bonita que ao investigarmos o denominador comum de todas as prescrições do Talmud para se ter uma vida longa, algo impressionante emerge: Ao fazermos do nosso corpo um lugar agradável, a alma não ficará ansiosa por voltar aos Céus, resultando numa longa existência aqui embaixo para esse corpo inteligentemente condicionado!

Trabalhemos para mudar a rotina de nossos casamentos e quebrar as mesmices dos hábitos que ameaçam nossas uniões com apatias e desgastes. Marquem um encontro um com o outro como vocês fizeram há muito tempo atrás, na época em que se conheceram, e anseiem em fazer o outro cônjuge mais feliz. Além de tudo, ambos estão agora mais maduros e têm um conhecimento mais profundo de si próprios. Ficaremos surpresos em descobrir como uma longa caminhada pode trazer à luz novas formas de aprimorar as vidas um do outro de maneiras incrivelmente importantes.

Empenhemo-nos para melhorar continuamente nossa paz no lar. Que o Todo-Poderoso possa nos abençoar sempre com a presença de Sua Shehiná em nossos lares, com boa saúde, harmonia e com incrível ydishe nachas (satisfação Judaica) de nossos filhos e netos!

Evitando Conflitos

O Talmud no Tratado Guitin relata que havia um Sábio excepcional chamado Guenivá. Quando ele entrou na Yeshivá (academia de estudos), algo de estranho aconteceu: o diretor discretamente indicou aos discípulos que não se levantassem para ele. Isto, a priori, pareceria um desacato a uma lei da própria Torá, em que fomos instruídos [Vaikrá 19:34] a reverenciar os Sábios da Torá. Mais tarde o diretor explicou aos alunos que, uma vez que Guenivá era uma pessoa encrenqueira, ele não merecia a honra de que os outros se levantassem para ele.

Entretanto, surge aqui uma questão óbvia: será que todas as pessoas não têm algum defeito? Além de tudo, o Rei Salomão, em seu livro Eclesiastes [Kohelet 7:20] ensinou: “Não existe pessoa correta no mundo que faz apenas o bem, sem pecar”. A lógica nos diria que deveriam ter demonstrado reverência a Guenivá por sua sagacidade na Torá apesar de seu defeito de ser um sujeito argumentativo.

A explicação, entretanto, é um dos fundamentos básicos da vida segundo os parâmetros da Torá. O Rambam (Rabino Moshe ben Maimon, também conhecido como Maimônides, Espanha e Egito, 1135-1204) nos ensinou que todos os 613 mandamentos da Torá foram dados com o intuito de gerar paz e harmonia no mundo. Como nos ensinou o Rei Salomão: “Os caminhos da Torá são caminhos de doçura e todas as suas vias são vias de paz [Provérbios (Mishlei) 3:17]”. Nós demonstramos o respeito da Torá somente àqueles que absorveram seus ensinamentos, tornando-os parte de seu ser e colocando-os na prática. O livro Hovot Halevavot, escrito pelo Rabino Ibn Pacuda (Espanha, 1050-1120), refere-se àquele que estuda Torá sem praticá-la como um “hamor nosse sefarim – um burro carregando livros”.

Portanto, o diretor da instituição veio ensinar que uma vez que Guenivá não era um homem de paz, este era um sinal que ele não absorvera suficientemente a Torá que estudara. Se a tivesse absorvido, inevitavelmente teria se transformado num ‘embaixador’ da tranquilidade. Assim sendo, ele ainda não merecia o respeito reservado aos Sábios da Torá.

O Talmud [Tratado Berahot 64a] ensinou: “Os sábios da Torá aumentam a paz no mundo”. Portanto, para se qualificar como um discípulo da Torá verdadeiro, a pessoa tem que ser um campeão da paz, seja em casa com seu cônjuge, seja lidando com seus pais ou sogros ou em qualquer outro tipo de relacionamento inter-pessoal. Uma personalidade de Torá pratica a ‘procura da paz’ o tempo todo. Por exemplo: ele age de modo a acalmar qualquer início de discussão na sinagoga, ele nunca é aquele que cria tumultos, mexendo na ‘panela’ de rumores e controvérsias contra os demais, ele está sempre de olho em acordos e reconciliações e nunca se envolve em intrigas e mexericos.

Com isto em mente, precisamos ‘gravar’ na mente de nossas crianças que um menino ou menina que estuda na escola e briga no recreio ou age com desprezo para com os funcionários, está em contradição absoluta em relação àquilo que deveriam demonstrar a partir do estudo do Judaísmo. Frisando estas idéias em suas mentes ajudará a garantir que, quando crescerem, nossas crianças estarão preparadas para serem maridos e esposas gentis e com compaixão. Se forem criadas com paixão pelo Shalom, a paz, isto servirá para protegê-las do tremendo sofrimento das brigas matrimoniais e do divórcio.

Quando percebermos uma discussão ou briga, devemos salientar que este não é, definitivamente, o caminho da Torá e que devemos sempre ficar bem longe deste tipo de comportamento. A característica do Shalom é a maior força que alguém pode adquirir, pois vemos que o versículo iguala a força com a paz. Como está escrito no Salmo 29 [11]: “D’us dará força à Sua nação, D’us abençoará Israel com paz”.

Que possamos merecer sempre, para nós e para os nossos amados, a paz de espírito, paz para a família, paz para o povo de Israel, e a maior de todas as pazes com a vinda do Mashiach rapidamente em nossos dias!

Ketivá VeHatimá Tová

Que sejamos todos inscritos e carimbados no Livro da Vida!