Palavras Constroem Mundos
Rabino Paysach J. Krohn
Sobre o Autor

Um dos maiores e mais solicitados oradores americanos da atualidade, o Rabino Paysach J. Krohn conquista sua platéia através de suas idéias e das histórias que utiliza para frisá-las.

Conhecido mundialmente por sua série de livros sobre o Maguid de Jerusalém, o Rabino Shalom Shwadron Z”tl (The Maggid Speaks, Around the Maggid’s Table, In The Footsteps of the Maggid, Along the Maggid’s Journey, Echoes of the Maggid e Reflections of the Maggid), repleto de histórias do cotidiano judaico, desde os anos 1700 até hoje, suas palestras são recheadas de humor, animação, sensibilidade, calor humano e sabedoria. Suas palestras, fitas cassete, vídeos e livros são entusiasticamente aguardados e bem-vindos em todo o mundo.

Seu estilo é inconfundível: transmite suas importantes mensagens falando um inglês muito rápido, mesclando seu gigantesco repertório de histórias com muitas ‘tiradas’ de humor.

O Rabino Krohn faz parte da quinta geração de uma família de mohelim e é autor do livro Bris Milah, um livro amplamente aclamado sobre as leis e costumes desde o nascimento da criança até a circuncisão, além de outros seis livros recheados de histórias e parábolas. Nesta palestra ele mescla histórias e exemplos de sabedoria, idealismo, humor, amor, animação e sensibilidade por nossos irmãos.

Se ele tem sucesso? Pergunte a alguma das milhares de pessoas que comparecem às suas palestras ou que fazem de suas fitas parte indispensável de suas vidas.

Shaná tová e boa leitura!

Há alguns anos, em Flatbush, Nova York, um senhor de idade que sempre se sentava na parte de trás da sinagoga, falou ao Rabino que queria doar um Sefer Torá. O cavalheiro, Sr. Shimshon Braum (nome fictício) falou ao Rabino que já havia encomendado um Sefer Torá a um sofer (escriba) e o trabalho estava quase concluído. O Rabino ficou muito surpreso: o Sr. Braum não era conhecido como uma pessoa de posses e o custo de um Sefer Torá pode chegar a 30.000 dólares.

O Rabino conversou com o sofer e descobriu que o Sr. Braum havia pago pequenas somas durante muitos anos e, recentemente, fizera o último pagamento. O Sefer Torá estaria concluído em alguns dias.

No Shabat, o Rabino anunciou as boas notícias aos congregantes e todos se dirigiram ao Sr. Braum para cumprimentá-lo e agradecer por sua generosa dádiva à sinagoga. Planos foram feitos para a Hachnassat Sefer Torá, o recebimento do Sefer Torá na sinagoga.

Algumas semanas depois, numa bela tarde de domingo, a congregação reuniu-se na casa do Sr. Braum e escoltou-o enquanto carregava o Sefer Torá de sua casa para a rua, e de lá para a sinagoga. Danças e cantos acompanharam aqueles que se revezavam para segurar a Torá, e uma refeição especial os aguardava na sinagoga em honra à ocasião.

Alguns dias depois, um vizinho perguntou ao Sr. Braum se havia algum motivo em particular para o fato de ter decidido que um Sefer Torá deveria ser escrito. No começo ele hesitou em falar sobre o assunto mas, no final, concordou e contou sua chocante e comovente história:


Shimshon Braum tinha apenas 16 anos quando os nazistas prenderam ele, seus pais e suas irmãs em Lodz, na Polônia, e os enviaram a um dos notórios campos de concentração. Pouco após a chegada, os pais foram separados das crianças e Shimshon nunca mais ouviu falar deles. Ele foi colocado em um campo de trabalhos forçados e passou diariamente por humilhações e sofrimentos.

Certa noite, enquanto estava deitado na cama, um soldado nazista entrou para checar os prisioneiros. Ele passou de cama em cama – e então viu Shimshon. De repente olhou para os pés de Shimshon, arrancou suas botas e gritou: “Estas botas agora são minhas”.

Shimshon ficou paralisado. As botas de couro lhe foram dadas por seus pais pouco antes da família ser capturada pelos nazistas. Shimshon as queria muito, pois eram seu último elo de conexão com seus amados pais. Ele não tinha fotos, cartas, nenhuma lembrança que pudesse segurar num momento de dificuldade para se fortalecer e agüentar a situação. As botas se tornaram suas preciosas lembranças.

Shimshon gritou desesperadamente. Este ato cruel do soldado nazista partiu os últimos laços tangíveis com seus pais. Era devastador. Shimshon chorou por horas e acabou adormecendo.

Na manhã seguinte, ele saiu do barracão descalço e encontrou o soldado que tinha pego as botas. Desesperado, ele implorou: “Por favor, me dê um par de sapatos. Não tenho nada para calçar meus pés. Vou congelar até a morte”. Ele nem se atreveu a antagonizar o soldado pedindo de volta suas próprias botas.

Para surpresa do rapaz, o soldado falou: “Espere aqui. Voltarei em cinco minutos com sapatos para você”.

Shimshon tremia de frio enquanto esperava. Em alguns minutos o soldado retornou com um par de sapatos e o entregou para o surpreso mas agradecido jovem.

Shimshon voltou ao barracão e sentou-se na cama para calçar seus novos sapatos. Ele os examinou cuidadosamente: eram feitos de madeira, como tamancos, mas ele sabia que teria que usá-los independentemente do material utilizado ou do desconforto. Quando já estava para colocar seu pé no sapato, olhou para o seu forro e engasgou: o forro era um pedaço de pergaminho de um Sefer Torá!

Shimshon ficou aterrorizado: como aquele nazista podia ser tão impiedoso? Como um Judeu poderia pisar nas palavras que o Todo-Poderoso falou para Moshe (Moisés) escrever para todas as gerações? Mas Shimshon sabia que não tinha escolha. Não havia mais nada para calçar, e a outra opção seria morrer de frio. Hesitante, cheio de culpa, calçou os sapatos.

Agora, muitos anos depois, o Sr. Shimshon disse: “A cada passo que dava, sentia-me como se estivesse pisando num Sefer Torá de D’us. Falei para mim mesmo: ‘Juro que se um dia sair vivo deste campo, não importa quão rico ou pobre eu for, algum dia providenciarei para que um Sefer Torá seja escrito e devolverei ao Todo-Poderoso a honra que Lhe tirei ao pisar em Sua Torá’. Foi por este motivo que doei o Sefer Torá à sinagoga”.

Impressionante, não? Esta palestra tem o objetivo de demonstrar e ensinar como podemos usar as expressões e palavras que saem de nossas bocas para construir mundos, tornando-nos pessoas melhores e que ajudam o próximo a também melhorar, conquistando e proporcionando um ano alegre e feliz para todos nós.

 

Gostaria de iniciar trazendo alguns versículos do primeiro tomo da Torá chamado, em hebraico, Bereshit (Gênesis), e aprenderemos algo sensacional.

Em Bereshit, no capítulo 37, a Torá nos relata sobre a venda de Yossef (José) por seus dez irmãos, todos os filhos de nosso Patriarca Yaácov (Jacob). Depois de haverem discutido, os dez irmãos reuniram-se para resolver o que fazer com seu irmão caçula, Yossef. Nesta hora, apareceu uma caravana de ismaelitas com seus camelos carregados de especiarias aromáticas.

Rashi, o grande comentarista da Torá (França, 1040-1104), perguntou: Por que a Torá fez questão de mencionar que a caravana estava carregando especiarias? Que diferença faria o tipo de carga? E respondeu citando um Midrash (uma das explicações mais profundas da Torá) que relata a intervenção do Todo-Poderoso pelo bem de Yossef: As caravanas ismaelitas normalmente carregavam cargas mal cheirosas e de forte odor, como petróleo e alcatrão. Mas como Yossef estava sendo carregado à força para o Egito, D’us não quis que ele viajasse em meio a um cheiro ruim e forte; por isso cuidou para que esta caravana fosse uma exceção, carregando especiarias aromáticas, o que amenizaria a longa e desagradável viagem.

Tenho um amigo chamado Dr. David Zalman Rosenblum, pediatra residente em Monsey, Nova York. Certa vez ele estava estudando o Talmud no tratado Arahin, página 16a, onde se conta que o Ketoret, o incenso trazido pelo Cohen no Beit HaMikdash (o grande Templo de Jerusalém) servia para perdoar o pecado de Lashón HaRá (fofocas e maledicências). O Dr. Rosenblum disse: “Talvez haja mais um motivo para os ismaelitas estarem carregando agradáveis especiarias: a Torá, alguns versículos antes, nos conta que Yossef havia falado mal de seus irmãos e D’us queria que ele, ao sentir o aroma das especiarias, se lembrasse de que o incenso veio para perdoar este pecado para poder fazer Teshuvá (arrepender-se do que havia falado de prejudicial sobre seus irmãos).

O pediatra achou que talvez sua idéia fosse uma boa explicação e resolveu apresentá-la ao diretor da Yeshivá Or Sameach, o Rabino Israel Simha Shorr. O Rabino pensou por algum tempo e respondeu: “A sua explicação me fez pensar em algo que nunca pensara antes. Você sabe onde os irmãos colocaram Yossef antes de despachá-lo com a caravana ismaelita? A Torá relata: ‘Eles (os irmãos) pegaram Yossef e o atiraram dentro de um poço - o poço estava vazio, sem água’. O Talmud (Shabat 22a) explica que água não tinha, mas havia cobras e escorpiões. Talvez ele foi atirado no buraco para ficar com as cobras pois, como sabemos, a Torá logo em seu início nos conta que a cobra falou Lashón HaRá contra D’us. Talvez esta foi a dica que Yossef estava recebendo, ou seja: do mesmo modo que a cobra falou contra D’us, Yossef falou mal de seus irmãos e deveria, então, se arrepender do que fez de errado”.

O Dr. David Zalman saiu muito feliz pois havia descoberto uma ‘pista’ em relação ao incenso e outra em relação às cobras no poço. Ao contar tudo isto a seu irmão mais jovem, ele contestou: “Está faltando uma peça neste quebra-cabeça: Rashi não disse que havia escorpiões junto com as cobras no poço em que Yossef foi jogado? E para que seu raciocínio tenha sentido, deveria haver uma explicação para os escorpiões também!”

O Dr. Rosenblum ficou perplexo: ele tinha certeza que se o incenso e as cobras simbolizavam o pecado de Yossef então, com certeza, os escorpiões deveriam ter algum significado também.

Quatro dias depois, o Dr. Rosenblum estava em seu consultório lendo um jornal médico chamado Pediatric Neurology (volume 17, número 4), quando se defrontou com o seguinte na página 304: “Uma criança de 13 anos de idade foi acometida de mutismo (a inabilidade de falar) por quase seis meses após ser picada por um escorpião! O mutismo durou vários meses até que a criança conseguisse murmurar algumas sílabas e se comunicar novamente”. Inimaginável!

Alguém poderia imaginar que uma pessoa picada por escorpiões ficaria incapacitada de falar? Eis a grandeza da Torá! Como explicou o Talmud, o poço continha cobras e escorpiões para ensinar algo a Yossef: a cobra falou maledicências contra D’us e o escorpião tem a capacidade de fazer com que uma pessoa fique incapacitada de falar!

Que incrível! Três dicas precisas sobre o erro de Yossef ao falar mal de seus irmãos.

Mas por que o incenso é um símbolo de perdão para aqueles que falam Lashón HaRá? Vejam a resposta do Talmud (tratado Arahin, 16a): “O Ketoret vem para perdoar o pecado de maledicência e fofocas. O incenso, que era oferecido no Beit HaMikdash de manhã e à tarde, era queimado quando não havia espectadores ao redor. O Cohen (sacerdote) dirigia-se até o altar de ouro que ficava na parte interior do Templo e o oferendava lá, longe dos olhos dos demais. Ou seja: da mesma maneira que uma pessoa, em geral, faz fuxicos e intrigas contra outros em particular, o incenso é queimado num ambiente particular para perdoar a pessoa que falou mal de outros”.

Mas acho que talvez haja mais um motivo pelo qual o incenso perdoa aqueles que falam Lashón HaRá. O Zôhar (o livro básico da Cabalá) traz uma dica de algo que é extremamente poderoso para proteger a pessoa contra todas as coisas ruins que possam lhe ocorrer: É um decreto de D’us que todo aquele que ler diariamente o trecho da Torá que relata sobre o incenso, salvar-se-á de toda e qualquer coisa ruim presente no mundo (Zôhar, Parashá Vaiakhel).

Qual o motivo de a leitura deste trecho ser algo tão poderoso? Creio que seja o seguinte: o incenso que era ofertado no grande Templo de Jerusalém consistia de 11 especiarias diferentes, sendo que uma se chamava Helbena. Esta erva apresentava um odor horrível. Mas se era assim, por que colocá-la junto das outras especiarias aromáticas? O Rabeinu Bahie (Espanha, 1263-1340) elucida em seu livro de explicações sobre a Torá: “A Helbena tem um odor terrível e mesmo assim é incluída no incenso. Por quê? Ela vem simbolicamente nos ensinar para não abrirmos mão das pessoas das quais não gostamos, deixando de ajudar ou orar por elas. Não os exclua!”

Existem muitas pessoas morando perto de nós mas que não convidamos, por exemplo, para uma refeição de Shabat. Ou pessoas com as quais não ‘vamos com a cara’, sem nenhum motivo especial, e por isso não ajudamos nem nos interessamos por elas e assim por diante.

Esta é a mensagem do incenso: Não excluamos estas pessoas e sim, esforcemo-nos para inclui-las em nossas vidas.

Mais um exemplo disto é a palavra em hebraico utilizada para designar um grupo de dez ou mais homens que se juntam para rezar: ‘Tsibur’. Em hebraico, esta palavra é composta por apenas três letras: Tsadik, Beit e Reish. Estas são também as letras iniciais das palavras ‘Tsadikim’ (justos), ‘Beinonim’ (medianos) e ‘Reshaim’ (pessoas não boas). Isto vem nos ensinar que precisamos nos esforçar para unir as pessoas, não apenas criticá-las e afastá-las. Talvez elas não tiveram uma boa casa como nós ou professores tão bons quanto os nossos. Portanto, ao inclui-las, estaremos gerando uma verdadeira unidade e fraternidade dentro do Povo.

E este é o significado da especiaria de mau odor, a Helbena, estar entre aquelas de bom odor: mesmo que não ‘cheire’ tão bem, nós a incluímos entre as demais porque ela faz parte daquela unidade chamada Ketoret, o incenso do Beit HaMikdash.

 

Todos sabemos que um dos grandes problemas da atualidade em nosso Povo é o problema de Shiduchim (pronuncia-se Shidurrim). Existem em todos os lugares rapazes excelentes procurando moças excelentes e moças maravilhosas procurando rapazes maravilhosos para casar, mas sem sucesso.

Uma destas moças, há algum tempo, foi a Israel visitar o Rabino Haim Kanievski, um dos líderes do Judaísmo hoje em dia, para pedir uma berahá (bênção. Pronuncia-se berarrá) para encontrar sua ‘cara-metade’.

Uma das pessoas mais maravilhosas neste universo é a esposa do Rabino Kanievski. Ela consegue sorrir, ser paciente e amigável com qualquer ser humano que vem à sua casa (e realmente são muitos). Esta moça, então, disse à Rebetsin (a esposa do Rabino) que ela tinha vindo pedir uma berahá para achar seu Shiduch. A Rebetsin respondeu-lhe: “Você quer uma ‘dica’ certa para achar seu Shiduch? Estude diariamente duas leis sobre como cuidar de sua fala (Shemirát HaLashón)!”

Sabem o que pensei quando a moça me contou isto? Não era apenas uma ‘simpatia’ cabalística que a Rebetsin havia lhe passado. Ao estudar duas leis diariamente, a pessoa aprende o que realmente é um casamento: é um relacionamento onde as palavras trocadas entre o casal podem construir e elevar o outro cônjuge ou o contrário. Ao estudar as leis da fala, a pessoa aprende a usar suas palavras para inspirar os demais e não para desmoralizá-los, bem como também a encorajar o seu cônjuge e não desencorajá-lo(a).

Aqueles que entendem sobre o assunto de casamento sabem que um bom rapaz procura numa possível esposa uma moça carinhosa que tenha consideração por seu marido e o encoraje. É verdade que existem muitos ‘espertos’ que procuram uma noiva rica. Porém, o segredo para se casar e se manter casado não é o dinheiro, mas um rosto sorridente e palavras de consideração.

Outro motivo pelo qual vale a pena tomar cuidado com a fala, explicou o Hafêts Haim, Rabino Ysrael Meir Kagan (Polônia, 1839-1933, o grande líder do mundo Judaico até seu falecimento), é que somente assim garante-se que as preces da pessoa serão atendidas. Quando uma pessoa aprende sobre as leis da fala e então começa a se cuidar para não mais usar um vocabulário baixo (palavrões), não zombar nem humilhar o próximo, não fofocar ou criar intrigas, etc, suas orações são atendidas.

Vejam o brilhante exemplo que ele contou: “Se alguém quer fazer um armário, não conseguirá se utilizar um serrote sem dentes ou um martelo sem cabo. E mesmo que o consiga, qualquer um perceberá a péssima qualidade do móvel. Se o marceneiro não possui ferramentas adequadas, não surpreende o fato de não conseguir fabricar um móvel bom”.

Explicou o Hafêts Haim: “Quando rezamos ou estudamos Torá, cada palavra que pronunciamos cria um anjo e estes anjos sobem até os Céus levando nossas palavras até o Trono Celestial onde D’us nos ouve”.

“Entretanto, se criamos anjos ‘capengas’ porque nossas bocas dizem algo que não é verdadeiro, é ofensivo ou doloroso, então nossas bocas se tornam um ‘serrote sem dentes’ e não conseguem levar as palavras das orações adequadamente até lá em cima”.

Podemos então entender melhor o que a Rebetsin Kanievski falou: ao estudar duas leis sobre a fala adequada, podemos conseguir que nossas preces sejam atendidas, construir anjos perfeitos que levarão nossos pedidos intactos até o Criador e não apenas usar este estudo como um amuleto para conseguir um bom marido.

 

o Talmud (Taanit 25b) conta uma história fascinante. Certa vez havia estiagem em Israel. Pediram ao Rabino Eliezer, o líder do Povo na época, para que rezasse pedindo chuva mas suas preces não foram atendidas. Pediram então a Rabi Akiva, um discípulo do Rabino Eliezer e, quando este rezou, as chuvas começaram a cair.

As pessoas começaram a falar: vejam só, o aluno Akiva é maior que seu mestre, o Rabino Eliezer. Mas explicou o Talmud: não foi este o motivo para as preces de Rabi Akiva terem sido atendidas e as do Rabino Eliezer não. Foi o fato de Rabi Akiva costumar ‘abrir mão de seus direitos’ e o Rabino Eliezer não.

Muitas vezes alguém nos faz algo ruim. Rabi Akiva vem nos ensinar: olhe para o outro lado. Ao não ‘encrencarmos’ com a outra pessoa, D’us também olhará para o outro lado se fizermos alguma coisa contra a vontade Dele. Nenhum de nós é perfeito e muitas vezes gostaríamos que o Todo-Poderoso não ‘olhasse’ para os nossos erros. O segredo para isto: aquele que abre mão de seus direitos e deixa passar alguma ofensa ou coisa ruim que lhe fizeram, garante que o Todo-Poderoso também agirá assim com ele, atendendo seus pedidos e suas orações.

Eis, então, duas coisas que estamos aprendendo para fazer antes mesmo do início das orações: tomar cuidado para construir anjos bons com nossas bocas a fim de que as rezas sejam ouvidas e bem aceitas e abrir mão de nossos direitos para evitar arrumar encrencas. Isto pode acontecer com nossos amigos, irmãos, primos, etc., que muitas vezes fazem alguma coisa que não gostamos ou pensamos que seria melhor se fosse de forma diferente. A solução nestes casos é: sempre que possível, abra mão de seus direitos e vontades e conceda a vez e a palavra ao seu interlocutor.

 

Há uma passagem fascinante no Talmud, no tratado Shabat (página 104a). Lá explica-se o significado e a posição das letras do alfabeto hebraico. Existem dois formatos para a letra (seria o equivalente à letra P, em português). Outra coisa interessante é que a palavra ‘boca’ em hebraico é ‘PE’, ou seja, é praticamente igual ao som da pronuncia da letra . Uma se escreve de forma aberta e a outra de forma fechada. Estes dois formatos de letra vêm nos ensinar que muitas vezes devemos usar o ‘PE’ aberto, ou seja: devemos abrir nossas bocas para dizer coisas boas e gentis sobre e para os outros. Por outro lado, às vezes devemos utilizar o fechado, ou seja: devemos fechar a boca para não fazer ‘comentários’, falar palavras de baixo calão, atormentar o marido ou a esposa, etc.

Quero lhes contar uma grande história:

Para muitas pessoas, informação significa poder e prestígio. Frequentemente, quando uma pessoa tem informações exclusivas sobre um evento ou um indivíduo, delicia-se ao compartilhar esta informação com os demais, exibindo sua habilidade em conseguir ‘dados confidenciais’.

Esta história aconteceu em Londres, na Inglaterra, mas poderia ter acontecido em qualquer outro lugar. Existem em muitas cidades do mundo organizações do tipo Tomchei Shabbos (pronuncia-se Tomrrei Shabes) que se encarregam de prover alimentos para o Shabat a famílias carentes. Semanalmente, com impressionante eficiência, um grupo de voluntários compra comidas típicas de Shabat, como suco de uvas, peixe, Halót (o pão trançado típico do Shabat), frango, frutas, vegetais e bolos de atacadistas que vendem estes alimentos a preço de custo ou até mesmo os doam. Outro grupo de voluntários reúne-se num galpão onde as provisões são armazenadas. Eles então embalam os alimentos em caixas de papelão conforme o tamanho da família a ser beneficiada. Na quarta ou quinta-feira, um terceiro grupo de voluntários entrega os pacotes às famílias carentes.

Raramente algum dos voluntários sabe a identidade dos recebedores destes pacotes, de forma que estes últimos não passem vergonha por estar recebendo ‘Cestas Básicas de Shabat’. Muitas vezes as caixas são deixadas na portaria do prédio de quem recebe, para que não haja um contato ‘cara a cara’ entre o voluntário e algum membro dessa família. Manter a dignidade deles é um dos princípios básicos dos dirigentes do Tomchei Shabbos.

Em Londres, o Sr. Zalman Beker (nome fictício) era o encarregado de coletar os fundos para a Tomchei Shabbos. Duas vezes por semana ele visitava potenciais doadores.

Certa vez indicaram-lhe uma pessoa muita rica e disseram que talvez ela fizesse uma boa doação para a organização. O Sr. Zalman foi à casa deste homem, conhecido por sua generosidade, apresentou-se e depois de algumas amenidades disse: “Estou coletando fundos para a organização Tomchei Shabbos e gostaria de pedir sua ajuda”. O homem não perguntou quanto dinheiro a organização gastava mensalmente, seu déficit ou quão eficientemente o dinheiro era empregado. Ele simplesmente falou: “Tudo bem, posso ajudar, mas gostaria de saber para onde o dinheiro está indo, quem são os que recebem os pacotes”. O Sr. Zalman lhe respondeu, surpreso: “O senhor sabe que não posso dizer quem são os que recebem os alimentos. Isto é algo estritamente confidencial, ninguém sabe quem eles são! Até os motoristas que entregam as caixas moram em bairros diferentes e recebem apenas um endereço onde entregá-las para não saberem a quem estão entregando! Eles não conhecem as famílias para que estas não se envergonhem. Nós nunca contamos a ninguém!”

“Veja”, falou o homem. “Eu não gostaria de dar para uma organização. Prefiro doar a alguma família em particular para me sentir conectado a ela, para sentir que estou realmente ajudando”. Vendo que o sr. Zalman não se comoveu com seu apelo, o homem falou: “Ouça: eu pretendia lhe dar 250 libras esterlinas, mas vou lhe dar £$ 500,00”.

O Sr. Zalman respondeu: “Não posso, nós nunca fizemos isto e não vou fazer agora!”

“O senhor não está me entendendo”, disse o homem, ficando exasperado. “Eu apenas quero me sentir conectado a alguma família. Passe-me apenas um nome. Não vou contar a ninguém. Abra uma exceção e vou lhe dar £$1.000,00!”

O Sr. Zalman ficou bravo, levantou-se para sair e disse: “Vou-me embora pois, mesmo que o senhor me desse £10.000,00, não lhe contaria, porque esta é nossa política e nunca será mudada enquanto eu for encarregado disto!”

De repente o homem falou: “Por favor, sente-se” e começou a chorar. Ele disse, soluçando: “Faça-me um favor: coloque-me em sua lista. Eu não tenho mais o dinheiro que tinha. Minha família e eu não temos mais nada. Estou desempregado e batalhando diariamente por nossa sobrevivência. Muitas pessoas pensam que continuo um homem muito rico e foi por isto que mandaram o senhor vir falar comigo. Eu estava muito envergonhado de ligar para o seu escritório porque pensei que, com certeza, logo as pessoas estariam comentando sobre o fato de eu constar em sua lista. Eu estava tentando ver se havia alguma maneira do senhor me revelar quem consta em sua lista, mas agora que vi como o senhor é cuidadoso e não irá contar a ninguém, por favor, coloque-me em sua lista”.


O Talmud no tratado Yomá (página 4b) nos ensina algo que muitas pessoas desconhecem. Por exemplo: se alguém conta alguma coisa a outra pessoa e lhe diz para guardar segredo, aí ela não repetirá a informação para mais ninguém. Fala o Talmud: É justamente o contrário: não podemos passar para frente nenhuma informação que tenhamos recebido a menos que tenhamos permissão expressa para fazê-lo. Segredo ou não, somo proibidos de repeti-la sem autorização.

Devemos respeitar a dignidade dos demais. Às vezes, uma pessoa tem um problema e quer desabafar com alguém mas, com certeza, ela não quer que sua vida seja ‘colocada no jornal’!

 

Existe um livro em nossa literatura chamado Nefesh HaHaim, de autoria do Rabino Haim de Volozhin (Lituânia, 1749-1821). Em seu prefácio, seu filho, o Rabino Ytschak, escreveu que seu pai sempre costumava repetir a importância de se envolver com a dor e o sofrimento dos demais. O Rabino Haim costumava dizer: “Ló Leatsmó Nivrá – Nenhuma pessoa foi criada para si só”.

Todos foram criados por D’us com determinados talentos: alguns sabem desenhar, outros sabem falar em público, outro tem facilidade com trabalhos manuais, sabem escrever bem e assim por diante. O Todo-Poderoso não criou ninguém para utilizar seus talentos somente em proveito próprio, para ficar rico, coberto de honras e glórias. Ele deu talentos a cada um de nós para os utilizarmos em benefício do próximo. Vou lhes contar sobre uma pessoa simples, um Judeu a quem milhares de pessoas devem a vida. E tudo por que ele certa vez disse: “Vou me esforçar para que isto nunca mais se repita!”

Certo dia da primavera de 1962, o Sr. Hershel Weber, morador do bairro de Williamsburg em Nova York, estava saindo da sinagoga em que costumava rezar e estudar, quando ouviu um homem passando na frente da sinagoga gritar que estava com uma dor terrível no peito. De repente o homem caiu no chão bem à sua frente.

O Sr. Hershel começou a gritar: “Socorro, socorro”, mas não havia nenhum médico por perto. Logo chamaram a polícia e uma ambulância. O Sr. Hershel ficou ao lado do homem sem saber o que fazer mas dizendo-lhe que a ajuda estava a caminho. Hershel viu o homem perder a consciência e seu rosto ficar azul. Tragicamente, alguns minutos depois o homem estava morto na calçada.

Pouco depois, dois policiais chegaram. Enquanto tomavam notas e analisavam a situação, o Sr. Hershel ouviu um oficial dizendo ao outro: “Se tivéssemos conseguido chegar alguns minutos mais cedo, poderíamos ter salvado este homem”.

O Sr. Hershel ficou chocado e traumatizado pelo ocorrido. Sabem o que ele fez? Ele dirigiu-se até uma loja de suprimentos médicos, comprou um pequeno tanque de oxigênio e guardou-o na sinagoga. Ele falou: “Não quero nunca mais em minha vida ficar assim sem ação. Vou guardar este tanque de oxigênio comigo e utilizá-lo se for possível”. Todos pensaram que ele enlouquecera.

Matriculou-se num curso de primeiros socorros ministrado pela Cruz Vermelha e levou alguns amigos com ele.

Quando havia alguma pequena emergência, logo as pessoas lhe telefonavam. Alguns meses depois, um senhor de idade que vivia em Williamsburg faleceu enquanto dormia. Quando sua esposa acordou na manhã seguinte, percebeu imediatamente que algo de muito terrível acontecera. Ela correu até a janela que dava para a rua e gritou desesperadamente por ajuda. Logo uma multidão juntou-se dentro e fora de sua casa. Alguém gritou: “Tragam o Hershel Weber!”

O senhor Hershel veio correndo com seu fiel tanque de oxigênio e alguns equipamentos médicos básicos. Logo que examinou o homem, percebeu que não havia nada a fazer. O homem já havia falecido há horas.

Ele saiu do quarto cabisbaixo e falou algumas palavras de consolo à viúva. Enquanto descia os degraus da escada que dava para a rua e abria caminho entre a grande multidão que se aglomerara, alguém falou: “Você viu o Hershel? Ele matou o homem!”

O Sr. Hershel ficou chocado: Ele havia vindo para ajudar! Quem fez este comentário desprezível deve ter pensado que como Hershel não era médico, o idoso havia morrido por ter recebido um socorro inadequado.

O Sr. Hershel começou a chorar incontrolavelmente. Como, pensou ele, um Judeu poderia dizer uma coisa destas sobre outro Judeu?

Pelos próximos dois dias Hershel ficou devastado. Toda vez que se lembrava daquelas palavras, seus olhos se enchiam de lágrimas. Ele decidiu então ir conversar com o Rebe de Satmer, o Rabino Yoel Teitelbaum (1887-1979), o maior e mais influente líder Hassídico de Williamsburg.

O Sr. Hershel recontou o incidente para o Rebe e perguntou: “O senhor não acha que seria uma boa idéia se houvesse um grupo de Judeus voluntários, com treinamento para atendimentos emergenciais, prontos para agir toda vez que alguma necessidade surgisse?”

O Rebe de Satmer pediu para Hershel trazer-lhe da estante o livro Shaarei Teshuvá, um livro clássico de nossa literatura de autoria do Rabino Yoná Guirondi (1180-1263). O Rebe abriu no terceiro capítulo onde se lia: “É benéfico e muito apropriado que haja em cada cidade voluntários inteligentes preparados e disponíveis para qualquer assistência (Hatsalá), para ajudar um homem ou mulher em angústia”.

O Rebe olhou para o Sr. Hershel Weber e disse: “Inicie a organização da qual falou e, por causa desta expressão no livro Shaarei Teshuvá, chame-a de Hatsalá!”

E assim surgiu a grande organização Hatsalá. Um homem passando por um determinado local por pura coincidência, reconheceu uma necessidade imperativa da comunidade. Muitos poderiam tê-lo feito, mas o Todo-Poderoso escolheu Hershel Weber porque ele tiraria o melhor proveito da situação.

Hoje a palavra Hatsalá já faz parte do vernáculo nova-iorquino e de outras cidades. Desde sua concepção, os voluntários da Hatsalá já salvaram milhares de vidas e aliviaram o sofrimento de dezenas de milhares de pessoas, inclusive no ataque às Torres Gêmeas, em Nova York, em 11 de setembro 2001. Muitos livros poderiam ser escritos sobre as experiências heróicas e emocionantes de seus membros e sobre as pessoas salvas por eles, mas isso não ocorrerá, pois a Hatsalá exige absoluta confidencialidade de seus membros. Seu sacrifício não conhece limites e seu comprometimento é total: são heróis que merecem apoio e reconhecimento da sociedade em geral.

Dá para imaginar os frutos gerados apenas porque um homem simples disse: “Não quero nunca mais em minha vida ficar sem ação!”?

 

Houve em nossa história um Rabino muito importante conhecido como Ramban, Este é um acrônimo para Rabino Moshe ben Nachman (Nachmânides) [1194-1270], de Gerona, na Espanha, um dos líderes da Torá durante a Idade Média. Entre suas inúmeras e importantes obras, há uma carta que ele escreveu para seu filho para fortificar-lhe a visão de humildade. Nela consta: “Acostume-se a se dirigir a qualquer pessoa sempre com calma e tranquilidade”.

O Ramban veio ensinar que devemos falar com calma, num tom agradável, sempre e com todos. Falemos de maneira amigável, cumprimentemos as pessoas em nossa casa, no local de trabalho ou estudo, em todo lugar. Quantas pessoas agradecem ao motorista do ônibus ou táxi que lhe trouxe até o seu destino? Ou ao ascensorista num elevador? Eles são seres humanos e merecem nosso respeito e cordialidade.

 

Certa vez ouvi uma expressão brilhante: “Você não precisa parar pelo resto de sua vida, você só precisa parar por hoje!” Esta seria uma grande expressão para quem está de dieta ou tentando parar de fumar ou beber, mas serve perfeitamente para pensarmos em como progredir espiritualmente em direção a um novo e melhor ano.

É muito difícil uma pessoa que é, por exemplo, nervosa, tomar a resolução de que “neste ano que se inicia, não vou mais me zangar ou discutir com ninguém!” É uma tarefa tão grande, que pode lhe ser quase impossível. “Mas você não precisa parar pelo resto de sua vida. Apenas hoje!” E o que será amanhã? Amanhã pensarei amanhã. Por enquanto, concentre-se em viver dia a dia, esforçando-se bastante no momento em que está vivendo.

O Rambam, acrônimo para Rabino Moshe ben Maimon (1135-1204), um dos maiores Sábios de toda a História do Judaísmo, escreveu: “Sabem o que quer dizer Ahavat Israel (Amar a outro Judeu como a si mesmo)? Significa que cada um deve amar o próximo como ama a si próprio. Portanto, deve falar coisas boas sobre os demais!”

Vocês sabiam que há um estudo que revelou o seguinte: dezenove de cada vinte comentários feitos pelos pais, em geral, a seus filhos são críticas? “Não faça isto, não faça aquilo, não derrube o leite, etc”. Isto vale também para o relacionamento professor aluno: existe a necessidade de haver mais mensagens positivas e de incentivo e não apenas críticas.

Amigos também precisam desenvolver este hábito: não fazer ‘comentários’ ou ‘observações’ sobre outras pessoas, ou escolher num grupinho aquele ‘coitado’ que será o bode expiatório da vez. Precisamos aprender a cumprimentar e louvar os demais e não o contrário.

O mesmo vale para maridos e esposas. Gosto muito de uma expressão que ouvi: “Se a esposa quer ser elogiada pelas Halót (o pão trançado típico do Shabat) que preparou, deve agradecer o marido pela ‘massa’ que ele trouxe para casa”.

Existe uma passagem no Talmud, no tratado Shabat, nos ensinando que, após os 120 anos, quando toda pessoa subir perante o Trono Celestial, ser-lhe-á perguntado: “Você honrou seu amigo como a um rei? Ou sua amiga como a uma rainha?” Está é uma de nossas tarefas na vida: tratar o próximo como se fosse um rei ou rainha; e isto vale para amigos, cônjuges, colegas de trabalho, primos, etc.

 

Gostaria de concluir trazendo uma história que nos inspirará e ensinará sobre o quanto podemos conseguir com palavras de incentivo e carinho:


O esporte nos Estados Unidos não é apenas uma indústria multibilionária; rara é a criança que cresceu nos Estados Unidos sem ter praticado algum esporte de competição, seja basquete, handball, futebol ou beisebol. Apesar de o beisebol ser um esporte típico americano, a mensagem desta história tem apelo universal, pois trata de valores de sensibilidade, auto-estima e aceitação.

No Brooklin, em Nova York, existe uma escola chamada Hush, especializada no tratamento de crianças com problemas motores e de aprendizado. Algumas crianças permanecem em Hush durante toda sua carreira escolar, enquanto outras podem ser encaminhadas a escolas ou Yeshivás convencionais. Há crianças que freqüentam Hush a maior parte da semana e vão a uma escola convencional nos demais dias.

Durante um jantar de arrecadação de fundos para a escola, o pai de um dos alunos fez um discurso que nunca se apagará da mente de todos que lá estavam. Após elogiar a escola e seu dedicado corpo de funcionários, ele exclamou com angústia na voz: “Onde está a perfeição em meu filho Shaya? Tudo que D’us faz, Ele o faz com perfeição. Mas meu filho não consegue entender as coisas como as demais crianças. Meu filho não consegue lembrar-se de fatos e figuras como as outras crianças o fazem. Onde está a perfeição de D’us?” A audiência ficou chocada com a questão e triste com a angústia do pai.

“Eu acredito”, respondeu o pai, “que quando D’us traz uma criança como esta para o mundo, a perfeição que Ele procura está na maneira como as pessoas reagirão a esta criança”.

Então ele contou a seguinte história sobre seu filho Shaya:


Shaya freqüentava Hush durante a semana e a Yeshivá Darchei Torá aos domingos. Numa tarde de domingo, Shaya e seu pai vieram à Yeshivá quando seus colegas de classe jogavam beisebol. Ele adorava beisebol mas, devido à sua falta de coordenação, nem sempre era escolhido para jogar. O jogo estava em andamento quando Shaya e seu pai se aproximaram do campo. Shaya então falou: “Pai, você acha que se você pedir, eles me deixam jogar?”

O pai de Shaya sabia que seu filho não era do tipo ‘atlético’ e muitos meninos não iriam querer ele no time. Mas sabia também que se o seu filho pudesse jogar, isto aumentaria sua auto-estima.

O pai aproximou-se de um dos garotos no campo e perguntou: “Vocês acham que meu Shaya poder entrar no jogo?” O garoto olhou em volta para seus colegas de time e como ninguém mais se manifestou, o time estava perdendo e o jogo quase no final, falou: “Por que não?” e Shaya entrou.

O pai de Shaya estava muito feliz e o garoto com um largo sorriso. Shaya vestiu uma luva e foi para o centro do campo. Não houve protestos do outro time que estaria agora enfrentando um time com um jogador a mais.

No final daquela etapa, o time de Shaya conseguiu marcar alguns pontos mas ainda estavam três pontos atrás do outro time. No final da nona etapa conseguiram empatar e Shaya era o próximo a rebater. Será que o time deixaria Shaya como rebatedor a esta altura do jogo, talvez perdendo a chance de ganhá-lo?

Para surpresa geral, falaram para Shaya pegar o taco e tentar rebater para marcar o ponto derradeiro. Todos sabiam que era impossível, pois Shaya nem sabia como segurar o taco corretamente, muito menos rebater com ele. Entretanto, Shaya se dirigiu até a sua base. O arremessador deu alguns passos para frente para poder lançar a bola com menos força para que Shaya pudesse ao menos ter contato com ela.

O primeiro arremesso veio e Shaya rodou com o taco, errando a bola. Um dos colegas do time veio até Shaya e juntos seguraram o taco, viraram na direção do arremessador e aguardaram o próximo arremesso. O arremessador novamente veio mais para frente para poder mandar uma bola mais ‘suave’ para Shaya.

Quando a bola estava chegando, Shaya e seu colega giraram o taco e juntos rebateram a bola de volta para o arremessador, uma bola lenta e rente ao chão. O arremessador pegou a bola e poderia facilmente tê-la jogado para seu colega da próxima base. Teriam ganhado o ponto e acabado com o jogo.

Ao invés disto, o arremessador pegou a bola e lançou-a bem para o alto e para a direita, muito longe do alcance do rapaz da primeira base. Todos começaram a gritar: “Shaya, corra para a primeira base! Corra para a primeira!” Nunca em sua vida Shaya havia corrido para a primeira base.

Ele correu com toda sua força até a primeira base, com os olhos arregalados, um pouco assustado e surpreso. Quando atingiu a base, o rapaz desta base já estava com a bola na mão. Ele poderia tê-la jogado para a segunda base, fechando o ponto enquanto Shaya ainda estava correndo. Mas havia entendido qual era a intenção do arremessador e arremessou a bola bem para o alto e longe do rapaz da segunda base enquanto todos gritavam: “Shaya, corra para a segunda! Corra para a segunda!”

Shaya correu para a segunda base. Quando chegou lá, o rapaz do outro time virou-o em direção à terceira base e gritou: “Corra para a terceira!”

Quando Shaya contornou a terceira base, os garotos de ambos os times corriam atrás dele, gritando: “Shaya, corra para ‘casa’ (a quarta e última base do campo)! Para ‘casa’!”

Shaya correu para ‘casa’, pisou na quarta base e todos os 18 garotos que estavam jogando levantaram-no sobre os ombros e o carregaram como a um herói que conseguiu marcar o ponto derradeiro e ganhar o jogo para seu time.

“Naquele dia”, falou o pai com lágrimas escorrendo por sua face, “aqueles dezoito garotos chegaram a um nível de perfeição. Eles demonstraram que não são apenas aqueles agraciados com talento que devem ser reconhecidos, mas também os que têm menos talentos. Eles também são seres humanos, também têm emoções e sentimentos e querem se sentir importantes!”

Esta é a excepcional lição deste episódio: “Freqüentemente procuramos favorecer e honrar aqueles que têm mais que nós. Mas existem pessoas que têm menos amigos que nós, menos dinheiro e prestígio. Estas pessoas especialmente precisam de nossa atenção e reconhecimento. Devemos tentar atingir o nível de perfeição nos relacionamentos humanos que os garotos da Yeshivá Darchei Torá conseguiram. Porque se as crianças conseguem usar suas palavras para construir mundos, nós adultos certamente também somos capazes fazê-lo!”

Que todos tenham um 5767 com muito crescimento espiritual e tranqüilidade material, repleto de alegrias e saúde!

Shaná tová a todos!